11 de dezembro de 2024

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No drama da pandemia, Bolívia pós-golpe vive cenário de cerco midiático e ‘silêncio cúmplice’

Nesta entrevista exclusiva, a ativista Dolores Arce, ex-diretora-executiva do Centro de Produções Radiofônicas da Bolívia (Cepra) e ex-chefe das Rádios dos Povos Originários (RPOs) – vinculadas ao Ministério da Comunicação – e operadas por organizações sociais e comunidades, denunciou que em seu país “a pandemia foi aproveitada para fazer negociatas com valores superfaturados”.

De acordo com a ativista, “em que pese o cerco midiático e o silêncio cúmplice da maioria dos grandes meios de comunicação, os escândalos inundaram as redes sociais e devido à pressão social não puderam ser encobertos”.

“O lucro das clínicas privadas é incontrolável: um teste de coronavírus varia entre US$ 100 e US$ 150, e a internação diária para pacientes com Covid-19 está acima de US$ 1.500, o que é uma sentença de morte para a grande maioria dos doentes”, afirmou.

Conforme Dolores Arce, “a lista de escândalos das atuais autoridades é longa, pois bastaram apenas seis meses para saquear e desfalcar os cofres do Estado e desmantelar as empresas públicas”. “Não há pior vírus do que este governo golpista, que ficará na história como o que se aproveitou da pandemia para fazer negócios obscuros e se agarrar ao poder”, sintetizou.

Por Leonardo Wexell Severo*

Diante da iminência de ser derrotada, a golpista Jeanine Áñez tenta postergar a data das eleições com a alegação de que diante do avanço da pandemia do coronavírus a Bolívia deve agora eleger entre a saúde e a política. Qual a sua opinião?

Na realidade se trata de um falso debate quando o governo transitório de Áñez, junto a atores políticos da direita, tentam confundir a opinião pública “que não é tempo de pensar em política, em eleições, mas em preservar a vida e a saúde”. Isso é algo absolutamente cínico, ainda mais vindo de um governo que precisamente tem se aproveitado da pandemia em seu próprio benefício. Portanto, que tem feito política para si com a Covid-19.

Para começar, se o pretexto fosse “por nossa saúde”, estaríamos em péssimas mãos. Não somente o governo demonstrou sua incapacidade: não existe um plano integral nem de prevenção e contenção. Há mais de 70 dias de quarentena, não existem testes massivos por falta de material, não se equiparam os hospitais nem foram entregues o material de biossegurança ao pessoal médico. Pior ainda, é uma vergonha e é de conhecimento mundial que a pandemia foi aproveitada para fazer negociatas com valores superfaturados, pagando três vezes o preço por respiradores que resultaram ser simples ventiladores, até agora não providos nem de baterias, nem de acessórios, que permanecem empacotados enquanto os mortos se multiplicam e no Departamento de Beni disparam os casos de contágios e morte por Covid-19.

Centro de Atendimento do Coronavírus em Beni: colchões sem lençóis nem travesseiros, nem respiradores

Como qualificar a prática do atual governo?

A corrupção e o roubo sempre foram parte do plano: no dia 7 de fevereiro de 2020 – ou seja 48 dias antes da declaração de quarentena, e coincidente com o descobrimento do escândalo de corrupção na Empresa Nacional de Telecomunicações (Entel) -, o Ministério de Economia e Finanças aprovou a Resolução Ministerial 043/2020, a mesma que permite não publicar informação das contratações realizadas no marco da emergência sanitária. Recordemos que, segundo o manual do Sistema de Contratações Estatais (Sicoes), existe a obrigatoriedade de que sejam publicadas as contratações e aquisições de montantes superiores a 20.000 Bs (aproximadamente 3.000 dólares). Portanto, a medida de Áñez fomenta a corrupção, dá carta branca para roubar. O mesmo fez em novembro do ano passado, três dias antes de se autoproclamar, aprovaram o Decreto Supremo (DS) 4078, com licença para matar, impunidade para militares e policiais em caso de provocar mortes em seu “trabalho” durante a repressão. Ainda que ambas disposições da época tenham sido anuladas pela pressão social, no período de sua vigência favorecem claramente a impunidade.

E como está atualmente a situação dos direitos humanos?

No plano político, durante a quarentena ocorreram inúmeros atropelos aos direitos humanos com a perseguição e detenção de pessoas simplesmente por expressarem sua opinião, com a fome e a solidariedade sendo criminalizadas. O pilar da estratégia de contenção da Covid-19 nunca foi sanitário, mas repressivo.

É inconcebível que sob a acusação de “atentado à saúde pública” estejam processados e com prisão domiciliar os integrantes de uma comissão do Trópico de Cochabamba que levou mantimentos e frutas a outros municípios de diferentes departamentos (Estados). Entre eles, um jornalista da emissora Radio Kawsachun Coca, por realizar seu trabalho de reportagem. Vários candidatos do Movimento Ao Socialismo (MAS) foram ameaçados e hostilizados (até presos, como a prefeita de Vinto, candidata a senadora), com falsas acusações do ministro de Governo, Arturo Murillo, que se crê ao mesmo tempo procurador, juiz e onipotente, incorrendo permanentemente em ingerências e imposições.

O grosseiro argumento de que devemos escolher entre a vida e as eleições é uma tentativa desesperada de aferrar-se ao poder, de postergar o quanto mais a data das eleições, para ganhar tempo de seguir roubando e beneficiando os interesses oligárquicos, empresariais e transnacionais. Claro que também com a ilusão de reconfigurar e beneficiar as candidaturas da direita.

Tentativas como as de propor o fechamento da Assembleia Legislativa Plurinacional são coordenadas no Palácio de Governo que levam claramente o selo do agente da CIA e atual assessor, Erick Foronda”

É muito preocupante que nenhum partido ou frente política, exceto o MAS, se pronuncie acerca de outras agressões como a intervenção militar na Assembleia Legislativa Plurinacional (ALP) com um ultimato para aprovar sua lista (irregular) de promoções. Ou as tentativas de propor o fechamento da ALP, ações coordenadas no Palácio de Governo que levam claramente o selo do agente da CIA e atual assessor, Erick Foronda.

Mesmo com toda a censura e controle dos meios de comunicação, vieram à luz diversos escândalos que expõem a natureza do atual governo. Como fica Áñez diante disso?

Em que pese o cerco midiático e o silêncio cúmplice da maioria dos grandes meios de comunicação, os escândalos inundaram as redes sociais e devido à pressão social não puderam ser encobertos.

A lista é longa, bastaram apenas seis meses para saquear e desfalcar os cofres do Estado e desmantelar as empresas públicas, que foram o butim das autoridades e dos parentes deste governo nefasto.

Um governo que não se vê somente manchado por fatos de corrupção, mas que está totalmente submerso neles; o desmantelamento e a paralisação de obras e empresas estratégicas se deu desde novembro, quando tomaram o poder. Os novos executivos, em muitos casos, são parentes diretos do clã Áñez Chávez ou dos respectivos ministros. Em outros casos são personagens ligados a empresas privadas cujo sonho e objetivo é aniquilar as empresas públicas. O que podemos esperar de um gerente da BOA (Boliviana de Aviação), que pertence à concorrente, a companhia aérea privada Amaszonas? A BOA parou de operar em muitos trechos aéreos que, logicamente, foram assumidos por empresas de avião privadas, sobretudo a Amaszonas. Tudo isto acompanhado de outros escândalos, com seus executivos se hospedando em hotéis 5 estrelas, às custas do Estado.

É de conhecimento público o desfalque que sofreu a Entel com o pagamento de quantias milionárias de acordos à margem da lei (não correspondente este honorário no caso de se trabalhar menos de 90 dias), a primeira ação do então gerente Elio Montes Chávez (primo da senhora Áñez Chávez) foi aumentar seu salário de 30.000 Bs (cerca de US$ 4.500) para 100.000 Bs (aproximadamente US$ 15.000). Vieram à luz outros escândalos de superfaturamentos que atingiram a empresa. Numa cortina de fumaça eles o destituíram, porém, dando-lhe tempo e garantias para fugir aos Estados Unidos nos primeiros dias de fevereiro.

E como se encontra a Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB), a principal estatal do país?

O mês de abril foi a vez da YPFB, que aproveitando a pandemia realizou compras diretas e vários contratos sem licitação pública. Foram cinco contratos para a compra de 1,5 milhão de barris de diesel a US$ 124 o barril, superfaturado em pelo menos quatro vezes. (O preço estava entre US$ 20 e 30, o que gera uma sobretaxa de pelo menos US$ 100 milhões).

Uma contratação direta – sem SICOES (Sistema de Contratações Estatais) – de Seguros Gerais para o período 2020-2021 por US$ 7 milhões (49 milhões Bs). No dia 23 de abril o contrato teve que ser paralisado por denúncias nas redes sociais e alguns meios de comunicação (Gigavision).

Um contrato de fornecimento de alimentação para seus trabalhadores de 416 Bs diários por funcionário, com a empresa Newrest, que entrou em vigência no dia 15 de abril passado, com prazo de execução até 31 de dezembro de 2020. Recordemos que o Bônus da Cesta concedido para setores vulneráveis durante toda a pandemia é de 400 Bs, numa única vez.

No dia 7 de maio destituíram o ex-presidente da YPFB, Hernand Soliz [envolvido em inúmeras denúncias de corrupção e irregularidades na contratação “emergencial” de seguros e na compra superfaturada de combustíveis no valor de US$ 160 milhões], e colocaram a Richard Botello [executivo da Shlumberger, maior empresa de serviços de petróleo do mundo], o que também é ilegal segundo nossa Constituição, porque trabalhou em uma transnacional.

Dias mais tarde explodiu o escândalo que envolve o Ministério da Saúde, com o superfaturamento na compra de respiradores, cujo custo máximo é de US$ 8.000, mas com o crédito do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) a aquisição foi de cerca de US$ 28.000, novamente com um impacto de mais de US$ 3 milhões.

Equipamentos que não atendem os requisitos das Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), tão necessitadas devido às suas condições precárias. Isso levou à remoção e prisão do ministro da Saúde, Marcelo Navajas, e de alguns outros funcionários, como bodes expiatórios, para tentar esconder os tentáculos que levam ao Palácio de Governo e à chancelaria, e a “intocáveis” como o embaixador da Ciência e Tecnologia (e genro de Áñez) Mohamed Mostajo Rajdi.

E maio nem bem terminou e um novo caso vem à tona: no Serviço de Impostos Nacionais (SIN) é descoberta uma rede conformada por um escritório de advogados e altos funcionários, que desde fevereiro vinham negociando “descontos, prorrogações e renúncias” para grandes clientes.

Em outras palavras: Desfalque ao Estado beneficiando a grandes devedores, entre os quais se encontram empresários corruptos que apoiam este regime. Não nos esquecemos que o “cívico” e empresário Fernando Camacho tem – ou tinha? – uma dívida de US$ 20 milhões com o fisco.

Por este fato [do SIN], nas últimas horas, foram demitidos de seus cargos Jorge Ledezma Salomon (gerente distrital), María Yolanda Vargas (chefe do departamento jurídico) e Roy Mansilla (supervisor técnico jurídico), após a divulgação feita pela advogada Teresa Paredes, que apresentou a denúncia dias atrás no Gabinete de Transparência do Serviço de Impostos Nacionais.

Outros escândalos ligados ao uso indevido de bens do Estado e tráfico de influências foram o pão de cada dia durante a pandemia, onde a cidadania estava obrigada a respeitar a quarentena, porém a título de “voos humanitários” os aviões da Força Aérea Boliviana foram utilizados para o deslocamento de amigos, parentes, misses e outros achegados aos governantes de plantão.

Além de ser um governo que viola os direitos humanos, cometeu massacres como o de Senkata e de Sacaba sem que há seis meses tenhamos um só acusado ou detido por esses crimes de lesa-humanidade”

Resumindo: A estas alturas, inclusive vários dos aliados políticos (como Fernando Camacho e Carlos Mesa) tentam tomar distância. É o governo que ficará na história como o que se aproveitou da pandemia para fazer negócios obscuros e se agarrar ao poder. Além de ser um governo que viola os direitos humanos, cometeu massacres como o de Senkata e de Sacaba sem que há seis meses tenhamos um só acusado ou detido por esses crimes de lesa-humanidade.

O departamento (Estado) de Beni está à beira do colapso. Como explicar tamanho desastre sanitário?

Depois de 42 dias sem relatar casos de Covid-19, em 29 de maio Beni já possui 1.576 casos positivos, com uma população de menos de meio milhão de habitantes em todo o departamento, dos quais cerca de 30% residem na capital, Trinidad.

Na realidade, a aparente boa administração e, portanto, o “silêncio epidemiológico” em Beni, que é vizinho ao Brasil, nunca foram assim. O que não houve e continuam sendo escassos são provas rápidas e testes para corroborar o contágio, de modo que quando o contágio foi disparado, tornou-se tão descontrolado que até hoje 70% do pessoal médico está isolado ou em tratamento. Já existem duas vítimas fatais de médicos, entre os quase 100 mortos no departamento, quando há 300 em todo o país.

O cemitério improvisado para as vítimas e casos suspeitos de coronavírus já conta com mais de 200 cruzes, muitas delas sem nome, como sinal de que a realidade é ainda mais dura do que os números oficiais. Os testemunhos das pessoas largadas à sua própria sorte são simplesmente de partir o coração.

O cemitério improvisado em Beni já conta com mais de 200 cruzes, muitas delas sem nome,como sinal de que a realidade é ainda mais dura do que os números oficiais

O drama é total e ultrapassa a capacidade do governo local, enquanto o governo nacional se ocupa com distrações como o fornecimento de ambulâncias odontológicas (que foram adquiridas na gestão de Evo Morales e tinham que ser entregues no aniversário de Potosí, em novembro do ano passado), ou um “centro de isolamento” com barracas e colchões no chão, o que, francamente, são um insulto às necessidades dos moradores de Trinidad.

Ao abandono histórico de departamentos distantes como Beni e Pando, que pela primeira vez tiveram um investimento importante, mas ainda insuficiente, e a presença do governo central com Evo Morales, agora se acrescenta a gestão demagógica de um governo que nos vende permanentemente gato por lebre, enchendo os bolsos quando tem a oportunidade.

Até agora os bolivianos não conhecem o destino dos mais de um bilhão de dólares em doações, créditos e dinheiro do Tesouro Geral da Nação, já que não há transparência nem acesso à informação.

Enquanto isso, a solidariedade do povo boliviano, de diferentes setores da sociedade civil, voltou-se para Beni para fazer chegar doações de alimentos e medicamentos, ante à indiferença, à incapacidade e à reação tardia das autoridades.

Não seria pertinente o imediato retorno dos médicos cubanos?

Apenas a teimosia de um governo cegado pelo ódio não é capaz de reconhecer o que outros países escolheram para combater a pandemia: as brigadas médicas cubanas. Em uma situação de emergência e crise sanitária como a atual, que ultrapassou totalmente a capacidade local, Áñez está brincando com a vida dos bolivianos por um capricho ideológico.

Qual é realidade da pandemia na Bolívia?

Em linhas gerais, a pouca quantidade de testes realizados nos permite deduzir que as cifras oficiais são pouco confiáveis, de fato. A nível de América Latina, a Bolívia é o país com menor quantidade de testes por milhão de habitantes. No relatório nº 75 da Covid-19, correspondente a 29 de maio, são contabilizados 8.731 casos positivos, 1.089 suspeitos, 749 recuperados e 300 falecidos. Os casos descartados são 18.234.

Os mais de 70 dias de quarentena deveriam ter servido ao governo para garantir testes, material de biossegurança, equipamentos e outras medidas para uma real prevenção e contenção, mas nada disso ocorreu.

O sistema de saúde pública está em péssimas mãos, o caso dos respiradores (ventiladores) é apenas um balão de ensaio. Enquanto isso, o lucro das clínicas privadas é incontrolável: um teste de coronavírus varia entre US$ 100 e US$ 150, e a internação diária para pacientes com Covid-19 está acima de US$ 1.500, o que é uma sentença de morte para a grande maioria dos doentes.

Entre os departamentos mais afetados, é claro, está Santa Cruz, que com cerca de 6.000 casos positivos concentra quase 70% dos casos. Apenas no último sábado, depois de quatro adiamentos e mais de 75 dias de quarentena, e onde Montero é uma das principais fontes de contágio no departamento, foi entregue o hospital de terceiro nível – com 200 camas e 12 leitos de UTI -, concluído há muito tempo. O motivo? Como a obra da gestão de Evo Morales usava tinta azul (MAS), ele precisou ser repintado da cor verde, do partido JUNTOS…

Estamos em um processo político em que a pandemia se converteu no pretexto perfeito para incutir medo nas pessoas e brincar com os números de acordo com a conveniência. A partir desta segunda-feira, 1º de junho, grande parte do país entrará em uma quarentena flexibilizada, cuja evolução é delegada aos governos e cidadãos locais, mas com a clara advertência de que se os números dispararem poderemos retornar a uma quarentena rígida.

Com o debate retomado na data das eleições, as autoridades governamentais fazem as projeções do pico futuro do contágio e, em vez de propor medidas preventivas e seguir protocolos internacionais, pretendem adiar as eleições sem uma data definida.

Diante deste quadro, qual a projeção para as próximas eleições?

O governo não está interessado em eleições, por isso se recusa a fixar uma data para se aferrar ao poder, sabendo que o seu desgaste vai se tornando maior a cada dia que passa, devido à sua incapacidade de lidar com a crise sanitária, pela economia estar entrando em colapso e pelos casos de corrupção que vão sendo descobertos.

Como bem disse Evo Morales em seu Twitter: “O governo golpista, com os Estados Unidos, definiu três objetivos: adiar as eleições indefinidamente, fechar a Assembleia e restaurar a Constituição Política do Estado (CPE) de 1994: querem acabar com os direitos dos setores populares e povos indígenas e impedir investigações de corrupção. A pátria e a democracia em perigo”.

Em 30 de abril de 2020, a presidente do Senado Eva Copa promulgou a Lei 1297 de adiamento da data das eleições, que fixa um prazo de 90 dias a partir de 3 de maio para a realização das mesmas. Imediatamente depois, o poder executivo e alguns senadores da UD apresentaram três recursos de inconstitucionalidade ao Tribunal Constitucional Plurinacional (TCP), que nos últimos dias enviou uma nota ao Senado, onde não determina a inconstitucionalidade da lei, mas um dos três recursos foi parcialmente admitido.

Aos argumentos que o Senado deve enviar ao TCP, haverá um período de até 45 dias para emitir a decisão. Entretanto, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) deveria pronunciar-se sobre a data até 18 de junho, o mais tardar, quando faltem 45 dias para o prazo final.

Temos vários cenários possíveis. No melhor, o TCP agiliza uma resposta nos próximos dias, viabilizando o processo, e o TSE por sua vez se pronuncia oficializando a data máxima para o domingo, 2 de agosto, encerrando assim a incerteza, sendo responsável por aplicar um protocolo de biossegurança para garantir as eleições em uma situação especial de crise sanitária.

No caso de se pronunciar a favor do recurso de inconstitucionalidade, a lei deverá voltar novamente ao Senado para fazer as alterações nas observações. O mandato pode ser estendido até outubro ou novembro deste ano (a eleição e posse de autoridades nacionais deve ocorrer, obrigatoriamente, na gestão 2020).

No terceiro cenário, pode ocorrer a situação extrema de um novo golpe de estado, onde se opte pelo fechamento da Assembleia Legislativa Plurinacional, seja continuando o país sob o comando de Áñez ou, eventualmente, nas mãos dos militares.

Não são os únicos obstáculos, estão em curso a perseguição judicial de nossos líderes e candidatos, há vozes que, desde o Norte (o sanguinário Carlos Sánchez Berzaín, exilado nos EUA e ex-ministro do governo de Goni Sánchez de Lozada), até se atrevem a ameaçar anular a Constituição Política do Estado. Outras tentativas desesperadas visam colocar no debate uma modificação da lei de assentos de representação parlamentar, fatos absolutamente inconstitucionais. O objetivo é prejudicar a representação territorial indígena, retornando a injustiça e a iniquidade histórica anterior.

Sem dúvida, a mobilização e o estado de alerta das organizações sociais e dos setores populares têm a grande tarefa de impedir que estes fatos sejam consumados, pelos quais também apelamos à solidariedade internacional dos povos irmãos e das organizações de direitos humanos.

Não há pior vírus do que este governo golpista. Somente um governo legítimo, eleito democraticamente, poderá nos reconduzir à pacificação e se encarregar das políticas públicas com o bem comum em mente. Temos nossos candidatos: Lucho Arce e David Choquehuanca, os únicos que podem devolver a esperança ao povo.

 

*Publicado originalmente com o seguinte título: Dolores Arce: “Internação com Covid-19 e Áñez na Bolívia equivale à sentença de morte