7 de dezembro de 2024

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Comunicação nos territórios fortalece a resistência democrática à agenda do capital

A atuação de comunicadores e comunicadoras populares nos diversos territórios brasileiros tem sido essencial para amplificar as vozes e populações silenciadas e invisibilizadas pela mídia hegemônica. Iniciativas de comunicação articuladas por jovens nas periferias dos grandes centros urbanos, na Amazônia e outros territórios são fundamentais para enfrentar as situações de conflito e desigualdade social, divulgar sua cultura e discutir seus problemas e questões a partir de sua própria linguagem. O desafio é fortalecer essa grande rede através do compartilhamento de conteúdos e experiências.

Por Elizângela Araújo, para o FNDC

Para a jornalista Katia Passos, ativista em Direitos Humanos e integrante da rede Jornalistas Livres, a comunicação democrática produzida nos territórios tem desempenhado um papel fundamental na pandemia ao mostrar como o Estado não vem conseguindo suprir as necessidades da população. “Temos um momento muito promissor com a juventude produzindo conteúdo nas periferias, registrando sua realidade com seus celulares, fazendo a notícia acontecer com linguagem própria, dentro do que eu chamo de comunicação democrática”.

A partir do contato com iniciativas de comunicação pela juventude da Zona Sul de São Paulo, a jornalista percebeu um processo solidário que ganhou corpo e ajudou a população a se unir para reivindicar seus direitos nesse processo de pandemia. “Comunicação democrática nada mais é do que o cumprimento desse papel nos territórios. Esse é o lugar do futuro da comunicação democrática”.

A jovem ativista e comunicadora Priscila Tapajowara falou a partir de sua experiência na rede Mídia Índia, que reúne mais de cem comunicadores indígenas em todo o país. “Estamos mostrando que enquanto parte da população das cidades está isolada em casa durante a pandemia, nos nossos territórios os invasores continuam atuando. As queimadas aumentaram, o número de áreas desmatadas aumentou”.

Priscila considera a experiência indispensável num país com a mídia monopolizada por grandes empresas e por uma elite branca. Embora gratificante, pontua, o trabalho da rede enfrenta desafios como o acesso à própria internet e aos equipamentos. “A juventude nas aldeias tem muita sede de aprender e produzir algo, mas há muitas dificuldades. Embora a internet facilite quebrar as barreiras de visibilidade, ainda é difícil o acesso a equipamentos e a conexão em vários territórios”.

Outra atuação importante da rede tem sido a divulgação de candidaturas indígenas nas eleições locais para prefeito e vereador. “Isso é muito importante, porque os jovem num território qualquer vão ver um indígena ocupando um espaço de poder e vão se sentir incentivados a ocupar esses espaços também”.

Descolonizar a comunicação

 

A jornalista Raíssa Galvão, uma das fundadoras e atual coordenadora de redes sociais da Mídia Ninja, falou sobre a experiência da Casa Ninja Amazônica. Lançada em âmbito on-line durante a pandemia para aproximar os comunicadores e comunicadoras populares nos estados da Amazônia Legal. “Como falar da questão da Amazônia com um repórter do sudeste? Por que não valorizar os profissionais locais? É preciso priorizar as pessoas que vivem nesses territórios. Esse foi um questionamento muito comum durante um encontro que promovemos com mais de cem representantes da região”.

Raíssa resgatou a atuação do jornalista Adecio Piran, que denunciou o “dia do fogo” no jornal Folha do Progresso, de sua propriedade, no ano passado. Piran foi o primeiro a publicar a ação de fazendeiros da região, que acabou viralizou e teve repercussão internacional. Depois disso, ele passou a ser perseguido e ameaçado. “Foi um grande alerta para nos fazer pensar na formação de uma rede de apoio e interlocução entre essas pessoas”.

“Quando a gente debate a comunicação em território é preciso entender como compreender esse Brasil cheio de realidades distintas e complementares. O Brasil não conhece o próprio Brasil e a gente tem que descolonizar mesmo nossa visão, acompanhar quem está nessas regiões produzindo notícia”, complementou.

Racismo e outras desigualdades

 

O jornalista Pedro Borges, fundador do site Alma Preta e integrante da Coalizão Negra por direitos, ressaltou que a democratização da mídia é fundamental para a superação do racismo, do sexismo e das desigualdades existentes no Brasil. “A comunicação no Brasil é um elemento fundamental não só para normalização do assassinato em massa de jovens negros – 65 mil jovens negros são assassinados por ano no país, mas também a incentiva. E a incentiva porque tem um projeto político, porque defende determinados interesses econômicos. Os grandes comunicadores brasileiros pertencem à casta mais rica da sociedade brasileira, que defende um projeto de concentração de renda, um projeto neoliberal que não se importa com a morte dessas pessoas que ela considera descartáveis”.

Diante disso, defende o jornalista, democratizar a mídia é fundamental para a construção de outros imaginários e outras possibilidades de sociedade. Para ele, a atuação de comunicadoras e comunicadores negros e negras, indígenas, LGBTs, das periferias dos grandes centros urbanos, das regiões rurais ou das florestas, “tem uma possibilidade e uma força gigantescas, porque podem construir uma esfera pública radical, diferente da espera pública do grande capital”.

Plataforma Eleitoral

A jornalista Larissa Gould falou sobre a Plataforma Eleitoral 2020, lançada em agosto pelo Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé com sugestões de políticas públicas para as candidaturas municipais em relação à comunicação. “É preciso pensar a comunicação no nosso próprio território. É natural sempre pensar nas políticas a partir da esfera federal, mas é preciso começar a lutar por políticas de comunicação a partir da nossa cidade”.

Larissa, que também integra a Rede Jornalistas Livres, lembrou que a exclusão digital escancarada pela pandemia também é uma exclusão social. Nesse contexto, ficou ainda mais evidente que a comunicação pública é uma questão estruturante. Ela lembrou que mais de 60% dos municípios brasileiros não têm mídia própria e a população fica restrita a grandes redes como Globo e à troca de mensagens via WhatsApp. “Por isso é importante leis que garantam que as cidades tenham mídia própria para discutir sua realidade”.

Outro dado relevante lembrando por Larissa é de que 28% dos municípios não têm uma infraestrutura de telecomunicação de alta capacidade. “e isso nos faz pensar que internet é essa que as pessoas estão acessando. É uma internet gratuita de aplicativo, que torna as pessoas reféns de conteúdos produzidos por poucos grupos”.

Entre os 26 pontos da Plataforma Eleitoral 2020, estão a criação de fundos públicos e linhas de crédito específicas para financiamento da produção independente, popular e comunitária; fomento dos meios alternativos de comunicação, valorização dos pequenos jornais e de projetos de pequenos empreendedores de comunicação, entre outros (clique aqui para acessar o documento).

Assista na íntegra: