Por Altamiro Borges*, em seu blog
Com o intento de “sangrar” o governo Dilma, a mídia privada promove diariamente a escandalização da política – com base nas prisões arbitrárias, nos vazamentos seletivos e nas “delações premiadas” de notórios bandidos. Este denuncismo, porém, desaparece do noticiário quando envolve algum cacique da oposição demotucana. Já virou até motivo de piada de que basta se filiar ao PSDB para não ser investigado, julgado ou preso no Brasil. A escandalização também inexiste quando atinge poderosos empresários. Na semana passada, pequenas notinhas informaram que vários bancos são suspeitos da formação de um criminoso “cartel do câmbio”. A bombástica notícia, entretanto, já sumiu da mídia.
Segundo relato da Folha, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) abriu um processo para investigar o “suposto” cartel formado por 15 instituições financeiras estrangeiras com o objetivo de manipular o mercado de câmbio. “É o primeiro processo antitruste no Brasil por manipulação de índices do mercado financeiro. Parte dos bancos já foi investigada pela mesma prática no Reino Unido, na Suíça e nos Estados Unidos, em processos que vieram a público a partir de 2013 e que somaram mais de US$ 5,8 bilhões em acordos e multas”.
Ainda de acordo com o jornal, a investigação do Cade é mantida sob total sigilo – não há vazamentos seletivos ou prisões arbitrárias. Sabe-se, apenas, os nomes das instituições financeiras envolvidas no suposto cartel no Brasil: Banco Standard de Investimentos, Banco Tokyo-Mitsubishi UFJ, Barclays, Citigroup, Credit Suisse, Deutsche Bank, HSBC, JPMorgan Chase, Merrill Lynch, Morgan Stanley, Nomura, Royal Bank of Canada, Royal Bank of Scotland, Standard Chartered e UBS, além de 30 pessoas físicas. “Procurados pela Folha, os bancos disseram que não vão comentar o assunto”.
A máfia dos banqueiros
As investigações do Cade comprovaram até agora a existência de “fortes indícios” de que os bancos adotaram práticas anticompetitivas, como a combinação de preço e de volume de moeda vendida a clientes e comprada deles. “Os operadores trocavam informações por meio de chats da plataforma da agência de notícias Bloomberg. O grupo se autodenominava com expressões como o ‘cartel’ e a ‘máfia’. As indicações preliminares são de que as condutas ocorreram, pelo menos, de 2007 a 2013 – mesmo período em que os bancos são investigados no exterior”.
Para o superintendente-geral do Cade, Eduardo Frade, os bancos investigados tentaram influenciar a Ptax – taxa calculada diariamente pelo Banco Central com base na média das operações de câmbio – e também as taxas de referência do Banco Central Europeu e da Reuters. Essas taxas são utilizadas para liquidar contratos em outros negócios, como financiamento de comércio exterior e proteção contra oscilação de moedas estrangeiras (hedge). “As supostas condutas teriam comprometido a concorrência, prejudicando as condições e os preços pagos pelos clientes”, afirma o Cade.
Os acusados terão um prazo de 30 dias para apresentar sua defesa. “Concluída a investigação, caberá à Superintendência-Geral do Cade recomendar a condenação ou o arquivamento do caso, que terá de ser julgado pelo tribunal do conselho. Não há um prazo para o julgamento, e Frade disse que não deve sair uma decisão ainda neste ano. Em caso de condenação, as multas previstas variam de 0,1% a 20% do faturamento do banco no ramo de atividade em que ocorreu a infração. Os administradores pessoas físicas podem ser multados de 1% a 20% do valor das empresas pelas quais operavam”.
A grave denúncia, que envolve bilhões de dólares, até agora não virou manchete nos jornalões, nem resultou em reportagens especiais nas revistonas ou em comentários histéricos contra a corrupção nas emissoras de rádio e tevê. Na prática, a mídia privada de há muito tempo está totalmente associada ao capital financeiro – é quase sua refém. Daí o silêncio ensurdecedor. A tendência é de que as apurações do Cade sumam totalmente da mídia. Esta operação-abafa não causaria qualquer surpresa.
Isto já ocorreu com a Operação Zelotes, que investiga as fraudes fiscais de vários ricaços – como os donos da Gerdau e da RBS, afliada da Globo. O mesmo fim teve a denúncia sobre a sonegação de impostos forjada pelo HSBC da Suíça – que também envolve figurinhas carimbadas da mídia. Na prática, a escandalização da corrupção sempre serviu a interesses econômicos e políticos. Só mesmo os ingênuos e os otários acreditam nos princípios éticos e na imparcialidade dos barões da mídia.
*Altamiro Borges é presidente do Barão de Itararé