Por Felipe Bianchi*
A Olimpíada Rio 2016 acontece em um período turbulento para os brasileiros. Mandatário interino do país, Michel Temer assumiu a cadeira presidencial através de um golpe midiático-judicial, afastando a presidenta Dilma Rousseff, democraticamente eleita por 54 milhões de brasileiros, e alçando ao poder o que há de mais retrógrado na política brasileira. Por isso, o cenário dos jogos promete pegar fogo não só pelo calor da tocha e da pira, mas pelos massivos protestos que devem ocorrer para denunciar o golpe em curso.
Controlados por sete famílias que formam um oligopólio da informação no país, os grandes meios de comunicação, comprometidos com o processo golpista, agem no sentido de distorcer e omitir a resistência ao golpe a luta em defesa da democracia. Por isso, dezenas de coletivos de mídia e veículos contra-hegemônicos farão cobertura colaborativa de todos os protestos e manifestações que ocorrerem durante os jogos. A ideia é dar visibilidade e repercussão internacional à denúncia do que ocorre no país, a despeito dos esforços da mídia privada e do governo provisório em asfixiar vozes dissonantes.
Como forma de contribuir nessa importante tarefa, o Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé promoverá uma cobertura multilíngue dos atos contra Temer e o golpe. Referência na luta pela democratização da comunicação no país e formada por jornalistas, intelectuais, ativistas digitais e lideranças de movimentos sociais, a entidade produzirá matérias em português e em idiomas como o inglês, o espanhol, o francês, o russo e o alemão.
A série será publicada no portal do Barão de Itararé (www.baraodeitarare.org.br) e divulgada em redes sociais como o Facebook (www.facebook.com/baraomidia) e Twitter (www.twitter.com/cbaraodeitarare). A hashtag #ForaTemerRio2016 será a etiqueta das publicações. A reprodução é livre, mediante citação da fonte.
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Os ataques de Temer à liberdade de expressão
Um dos casos mais emblemáticos da ofensiva do governo interino sobre a liberdade de expressão é a tentativa de desmonte da incipiente comunicação pública brasileira. “O Brasil é estreante na construção de meios públicos de comunicação. Nosso histórico remete a um modelo estritamente comercial, típico dos Estados Unidos”, afirma Renata Mielli, coordenadora do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC). “Por isso, nossa democracia se ressentiu, durante décadas, de uma comunicação pública que buscasse outro olhar sobre os acontecimentos e sobre a pluralidade e diversididade cultural e regional”.
A Empresa Brasil de Comunicação (EBC), criada em 2007, é a iniciativa que busca construir o setor partindo da estaca zero. “Isso significa dar voz a segmentos antes invisibilizados”, comenta Mielli. “A TV Brasil estreou, recentemente, o primeiro programa do país voltado ao público homossexual, comprometida com as questões desta comunidade”. O jornalismo diverso produzido pela EBC, reflete a jornalista, rompe com o discurso único do monopólio midiático no Brasil.
O problema, segundo Mielli, é que o golpe não convive bem com essa diversidade na comunicação. “Não é possível consolidar um processo ilegítimo com focos de combate e questionamento na mídia”, alerta. Por isso, a EBC, que é uma empresa pública, mas institucionalmente vinculada ao Estado brasileiro, sofreu intervenção por parte do novo governo, que nomeou um novo diretor de forma ilegal, mudando os rumos da Empresa. Como a Justiça anulou a medida (único revés judicial sofrido por Temer até o momento), o governo promete, agora, aprovar lei que altera o caráter público da EBC.
Quanto aos jogos olímpicos, Renata Mielli avalia que a cobertura jornalística do evento tem duas dimensões: o acompanhamento das competições e a observação do que ocorre fora da arena esportiva. “A iniciativa de produzir conteúdo que busca contextualizar as olimpíadas no cenário político brasileiro é fundamental para superar o bloqueio da informação”, opina. “Esse evento, concebido em um período de afirmação da soberania e da capacidade do povo brasileiro, ocorre, agora, em um momento de retrocesso. O mundo só vai compreender isso se existir essa outra narrativa dos fatos”.
Calando a divergência
Outra medida levada a cabo por Temer antes mesmo da consolidação do impeachment de Dilma Rousseff – a votação final no Senado brasileiro deve começar dias após o encerramento da Olímpiada – reflete bem a mão de ferro do golpismo contra a diversidade de opiniões e ideias. A Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, órgão responsável por definir os critérios de distribuição da verba publicitária aos meios de comunicação, rompeu unilateralmente os contratos de publicidade com blogs e meios do campo progressista.
De acordo com o presidente do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, Altamiro Borges, o critério de repartição da publicidade oficial é historicamente antidemocrático. “O fomento aos meios de comunicação contra-hegemônicos é uma grande dívida dos governos brasileiros, já que esses sempre receberam quantias pouco significativas. Já as famílias que dominam o setor abocanham quase todo o bolo e, comprometidas com o golpe, devem passar a devorá-lo na totalidade”, comenta.
Autor do Blog do Miro, o jornalista critica a atitude de Temer em cortar a verba destinada aos meios alternativos. Para ele, o cenário, que já é de concentração, tende a piorar. “Ao suspender os contratos, Temer escancara a sua intolerância para com a liberdade de expressão e deixa claro: não aceitará divergência durante seu governo”, opina.
Os movimentos populares no Rio-2016
Com os holofotes do mundo apontados para o Brasil, os movimentos populares prometem ocupar as ruas do Rio de Janeiro para reverberar internacionalmente a denúncia do golpe em curso no país. No dia 4 de agosto, véspera da abertura dos jogos, a Frente Brasil Popular e a Frente Povo Sem Medo concederão entrevista coletiva para a imprensa estrangeira. As Frentes reúnem os principais movimentos sociais brasileiros, de diversas matizes do campo progressista.
O grande ato dos movimentos está marcado para a sexta-feira (5), a partir das 11h, em Copacabana. A bandeira escolhida pelos movimentos é a seguinte: “Fora Temer! Nenhum direito a menos! Contra a calamidade olímpica!”. Mais cedo, às 10h, as “Mulheres pela democracia” realizam protesto na Estação Arco Verde.
*Felipe Bianchi é jornalista do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé