5 de dezembro de 2024

Search
Close this search box.

Estratégias de comunicação são centrais na batalha de ideias, e não apenas nas eleições

A importância da comunicação para conscientizar a sociedade e disputar ideias foi tema de debate em Salvador (BA) na manhã deste sábado (30). Reunidos na capital baiana, comunicadores defenderam o investimento em veículos contra-hegemônicos como essencial para reorganizar o campo progressista frente o avanço do conservadorismo no Brasil e no mundo.

Por Mayara Paixão

A mesa “A comunicação como questão estratégica” faz parte do seminário “Os desafios da comunicação nas administrações públicas”, que acontece desde sexta-feira (29). O evento está em sua terceira edição e é organizado pelo Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé.

Um dos debatedores, o diretor e editor-chefe do Le Monde Diplomatique Brasil, Silvio Caccia Bava, defendeu a urgência de plataformas críticas e que apresentem narrativas diferentes aquelas impostas pelos veículos hegemônicos. Segundo o jornalista, o acesso à pluralidade de vozes e perspectivas é fundamental para o fortalecimento da organização social.

“Se não tivermos um conjunto de órgãos de comunicação contra-hegemônicos alertando a população sobre a perda de direitos, não temos como subsidiar as mobilizações sociais e as lutas por direitos”, afirmou Bava.

Ele ainda lembrou a obra  “Manufacturing Consent” (1994), de Noam Chomky e Edward Herman. De acordo com o estudo do livro, os meios de comunicação de massa têm atuado na defesa de interesses do estado e da atividade privada, e não da população. Os veículos contra-hegemônicos seriam uma alternativa a esse cenário.

Já o publicitário Chico Malfitani trouxe para o debate a importância do marketing e da publicidade. Segundo ele, sob o governo de Jair Bolsonaro (PSL), é preciso que a coerência do campo progressista brasileiro passe também pela unidade do campo da comunicação e disseminação de ideias.

“Vivemos em uma sociedade de comunicação de massa na qual as ideias neoliberais estão tomando conta da população. Temos que ter uma comunicação clara e unitária na esquerda”, afirmou Malfitani.

Ele lembrou o êxito dos grupos da direita política ao levarem para as ruas, desde as mobilizações de 2013, a bandeira da “anticorrupção” como unidade narrativa; e afirmou que a saída para a esquerda não é apenas contrapor essa narrativa, mas sim disseminar suas próprias propostas com um guarda-chuva de temas, como distribuição de renda, defesa do petróleo e geração de empregos.

::Leia também: Sociedade deve exigir transparência das plataformas digitais, defendem pesquisadores::

10 anos da Confecom

Presente no debate, a jornalista Tereza Cruvinel, primeira presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), lembrou os recém-completados dez anos da Conferência Nacional de Comunicação (Confecom). Em 2009, o evento possibilitou o debate entre sociedade civil, governo e empresariado sobre as mudanças necessárias no campo da comunicação brasileira. 

Da Confecom, saíram centenas de propostas aprovadas como prioritárias, e o compromisso de um novo marco regulatório das comunicações, mais democrático e plural. No Brasil, a radiodifusão permanece regida por uma legislação da época da Ditadura Militar (1964 – 1985), o Código Brasileiro de Telecomunicações de 1962.

Foto: Fernando Vivas/GOVBA

Apesar de incorporadas pelas agendas de reivindicações de movimentos sociais e populares, as demandas formuladas na Confecom não foram implementadas pelo governo federal, mesmo no decorrer de governos progressistas — cenário ao qual Cruvinel é crítica.

“A mudança no panorama da radiodifusão brasileira é fundamental para discutirmos a colonização de mentes”, afirmou a jornalista. “Para que se tenha uma democracia de fato, precisamos de cidadãos bem informados e, quando temos um pequeno grupo controlando a difusão de informações para a sociedade, isso é impossível”, completou.

Cruvinel ainda destacou avanços pontuais, como a aprovação do Marco Regulatório da Internet e da Lei de Proteção de Dados (LGPDP), mas destaca que a uma mudança nos oligopólios de mídia do país só será possível se associada à luta por mudança política, que tem seu ponto alto nas eleições presidenciais de 2022.

Consórcio Nordeste

Fernando Morais, escritor e fundador do blog Nocaute, saudou a iniciativa do Consórcio Interestadual de Desenvolvimento Sustentável do Nordeste (Consórcio Nordeste) como uma esperança nesse cenário. “É uma força política”, caracterizou.

Além de uma parceria econômica e política entre nove estados da região Nordeste, o Consórcio também lançou recentemente o programa de rádio “Giro Nordeste”. Com a objetivo de aumentar a integração e a difusão de informação regional, o programa reúne notícias dos estados nordestinos e é retransmitido em diversas emissoras. Uma nova parceria de comunicação está sendo formulada, mas dessa vez na televisão. 

Para Morais, o bloco é essencial para o combate à falta de informação na região. “Mais do que nunca, é hora de juntar forças”, defendeu o escritor.

Nesse sentido, o coordenador-geral da TVT (TV dos Trabalhadores) e da Rede Brasil Atual, Paulo Salvador, chamou atenção para a necessidade de pensar não somente o uso mídias digitais, mas também o rádio e a televisão. A TVT, por exemplo, é a primeira emissora de televisão outorgada a um sindicato de trabalhadores  no país, no ano de 2010. 

Salvador ainda destacou o financiamento coletivo das mídias alternativas, como muitos veículos têm feito atualmente. Segundo ele, essa é uma forma de fortalecer democraticamente o campo da comunicação no Brasil.

A mesa contou com mediação de Altamiro Borges, presidente do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, e Kiko Nogueira, diretor-executivo do Diário do Centro do Mundo (DCM). O debate completo está disponível aqui.