Exmos. Srs. Presidentes do Senado Federal e da Câmara dos Deputados,
A Coalizão Direitos na Rede, coletivo que reúne mais de 40 entidades da sociedade civil e organizações acadêmicas que trabalham em defesa dos direitos digitais, vem declarar o seu apoio ao anteprojeto de lei sobre proteção de dados em investigações criminais e na área de segurança pública, formalizado na tarde do dia 5 de novembro de 2020.
A articulação, que participou ativamente das discussões que antecederam a sanção da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais e da Medida Provisória n. 869/2020, entende os esforços empreendidos pelo Grupo de Trabalho de Juristas, coordenado pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça Nefi Cordeiro, como essenciais para a garantia do direito à privacidade e proteção de dados no Brasil e para brasileiros.
O anteprojeto de lei em questão se dedica a regulamentar as exceções colocadas pelo artigo 4º da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, que retirou atividades de segurança pública, investigações penais e persecução criminal do escopo de aplicação da LGPD. A regulamentação do uso de dados pessoais para fins de investigações criminais e atividades de segurança pública é, portanto, uma proposta legislativa imprescindível, ao passo que oferece uma compatibilização fundamental entre a necessidade do Estado acessar dados pessoais para atividades de segurança pública e a importância de se salvaguardar direitos dos cidadãos e oferecer remédios a eventuais abusos cometidos por autoridades.
Sobre a proposta apresentada, entendemos que ela se dedica a realizar um debate importante entre atividades de tratamento de dados pessoais e atividades de segurança pública e persecução criminal de modo a harmonizar princípios aplicáveis à proteção de dados pessoais, como os da proporcionalidade e da necessidade, às atividades já empregadas pelo Estado.
Ante o crescente emprego de tecnologias que coletam dados pessoais de forma massiva no contexto de segurança pública e persecução penal, como, por exemplo, sistemas preditivos baseados em inteligência artificial, reconhecimento facial ou ferramentas de tratamento de dados de geolocalização, a regulamentação de sua aplicação por autoridades de segurança pública oferece uma possibilidade para que o sistema de Justiça brasileiro não continue perpetuando desigualdades e vieses presentes nessas tecnologias.
Nesse sentido, também são bem vindas as soluções apresentadas pelo anteprojeto de lei sobre a elaboração de relatórios de impacto regulatório e de tratamento de dados, bem como as obrigações de transparência conferidas pela previsão em questão às atividades de tratamento de dados pessoais exercidas no âmbito de autoridades como a Polícia Federal e próprio sistema de Justiça.
Aprovada, a lei ainda poderá trazer parâmetros para o uso adequado e legítimo da tecnologia na atividade policial, visto que definirá como tais mecanismos poderão auxiliar autoridades a alcançarem a finalidade de segurança pública observando direitos fundamentais. Nesse sentido, destaca-se positivamente a consistência terminológica e conceitual do anteprojeto à LGPD, imprescindível para garantir segurança jurídica no novo quadro regulatório da proteção de dados no país.
Adicionalmente, é importante mencionar que o anteprojeto de lei está alinhado com iniciativas e discussões internacionais relacionadas ao tratamento de dados pessoais para fins de atividades de segurança pública, como a Diretiva n. 2016/680 do Parlamento Europeu. Nesse sentido, a aprovação de um projeto de lei sobre o tema em questão, além de mais um passo importante para o Brasil no campo de proteção de dados pessoais, facilitaria atividades de cooperação jurídica internacional, sobretudo em matéria penal.
Assim, as entidades que integram a Coalizão Direitos na Rede esperam contar com o apoio do Congresso Nacional para a promoção de uma discussão participativa sobre o anteprojeto com todos os setores interessados e sua posterior aprovação. Longe de inviabilizar investigações e eventuais responsabilizações de agentes que violem as leis em vigor no país, o Parlamento brasileiro confirmaria assim seu compromisso com a defesa e garantia dos direitos fundamentais de todos os cidadãos e cidadãs.
Brasília, 9 de novembro
Coalizão Direitos na Rede