7 de julho de 2024

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Iroel Sánchez, presente: parceiro da mídia alternativa brasileira deixa legado na comunicação

Parceiro histórico da mídia alternativa brasileira, Iroel Sánchez faleceu na quinta-feira, 18 de maio, aos 58 anos de idade, em Havana. A partida física do dirigente cultural, jornalista, analista político, escritor, editor, realizador audiovisual e intelectual provocou comoção e homenagens em Cuba e também no Brasil.

“Iroel Sánchez se tornou um amigo do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé desde a sua fundação, em maio de 2010”, explica Altamiro Borges, coordenador da entidade que reúne diversos segmentos da sociedade – movimentos sociais, acadêmicos, comunicadores e lideranças políticas – na luta pela democratização da comunicação no país.

“Como comunicador e editor do site La Pupila Insomne, ele veio ao Brasil e participou de várias atividades organizadas pela entidade, como no histórico Encontro Mundial de Blogueiros, realizado 2011, em Foz do Iguaçu, Paraná”, recorda Miro. Ele também participou de encontros de blogueiros em São Paulo e na Bahia, além do Seminário Mídia e Democracia nas Américas, promovido pelo Barão de Itararé em 2015, discutindo a experiência da Revolução Cubana no enfrentamento ao bloqueio informativo e ao cerco midiático que a mídia hegemônica global exerce, até hoje, contra Cuba.

Iroel Sánchez, o primeiro da direita para a esquerda, em evento promovido pelo Barão de Itararé, em São Paulo, no ano de 2015.

“Ele sempre nos ajudou a entender o papel do imperialismo ianque e de suas mídias e agências de manipulação e dominação”, relata Miro. “Ele também nos ajudou a entender os desafios da Revolução Cubana e a luta de ideias na heroica ilha. A última vez que estive com ele foi num seminário sobre guerra cibernética e o cibererativismo digital em Havana. Além dos debates, pude conviver com sua família em um jantar que varou a madrugada, regado a muita reflexão, muitas risadas e várias doses de rum. Iroel deixa uma enorme saudade. Fará muita falta”.

O intelectual cubano foi alçado à vida política a partir de sua atuação como estudante e dirigente da União de Jovens Comunistas. A partir daí, começou a construir frentes importantes na cultura e na comunicação: fundou editoras, programas de televisão e para as redes sociais, além de ter sido membro da União de Jornalistas, Escritores e Artistas de Cuba. Foi, também, uma dos grandes colaboradores da TeleSur.

Integrante da coordenação do Barão de Itararé durante os 13 anos da entidade e atualmente coordenadora do Comitê Gestor da Internet no Brasil, Renata Mielli também se pronunciou sobre o tema. “Estive com Iroel em março deste ano, durante o encontro Pátria, em Havana, que reuniu dezenas de militantes para discutir os desafios para a comunicação diante de um mundo mediado por gigantes da economia capitalista”, conta. “Foi uma alegria encontrá-lo. Um camarada sempre muito caloroso, atencioso e amigo do nosso Barão de Itararé. Suas intervenções no encontro trouxeram aspectos importantes para a luta atual. E entusiasmo. Porque o Iroel era um entusiasta da luta política em defesa do socialismo. Sua partida é uma perda enorme para todos nós”.

Editor da Revista Fórum, Renato Rovai avalia que, com Iroel, parte um pedaço importante da luta pela democratização da informação na América Latina, mas que ficam seus ensinamentos. “Iroel foi antes de mais nada um grande amigo que eu ganhei na militância da blogosfera. Um querido, um humanista, um intelectual poderoso e humilde, uma companhia muito mais que agradável, luminosa. Eu e Dri tivemos a oportunidade de passar um dia inteiro andando por Havana Vieja com ele e recebendo seus ensinamentos sobre José Marti, Fidel e a revolução. Foi uma das aulas mais preciosas que tive na minha vida. Nunca esquecerei. Parte um pedaço da luta latinoamericana na defesa da democratização das comunicações no planeta, mas ficam semeadas suas lições. Salve, Iroel. Que sempre estará presente”.

Jornalista e também membro da coordenação do Barão de Itararé, Rodrigo Vianna contou passagens de sua visita a Cuba cerca de uma década atrás. “Muito triste com a partida de Iroel, que me recebeu em Havana há uns 10 anos. Jantamos na casa da mãe dele,uma casa daquelas antigas. Morava outra família na frente. “Toquei a campainha e veio uma mulher com a toalha enrolada na cabeça, parecia um filme de Pedro Almodóvar. Era a vizinha. O marido veio atrás e queria saber quem era aquele cara batendo à porta. Aí apareceram Iroel e a mãe. Duas figuras. A casa dela tinha entrada pelo pátio lateral. Na sala da casa, um retrato gigante de Fidel Castro. Conversamos profundamente madrugada adentro. Rodamos muito por Havana e até dei camisas do Brasil para os filhos dele. Muito triste com seu falecimento”.

Iroel em Foz do Iguaçu

No artigo intitulado “Sem coincidências em Foz do Iguaçu” (“Sin casualidades en Foz de Iguazú”), publicado no portal CubAhora e em seu blog, no dia 3 de novembro de 2011, Iroel compartilhou suas impressões sobre o evento realizado pelo Barão de Itararé. Vale a pena conferir alguns trechos:

“É madrugada na sala de espera do aeroporto de Foz do Iguaçu e um estande de venda de livros me chama a atenção. Entre os best-sellers do momento, incluindo duas biografias de Steve Jobs, um livro com capa tipográfica – letras negras sobre fundo vermelho – ocupam o lugar mais destacado. Seu título: “Os últimos soldados da guerra fria”, de Fernando Morais. Entre o nome da obra e do autor, uma oração anuncia o tema: ‘A história dos agentes infiltrados por Cuba em organizações de extrema-direita nos Estados Unidos’. Me sinto sortudo. Um exemplo do livro de Morais viaja em minha bagagem na volta ao meu país.

(…) O que percebi nos intercâmbios entre os mais de 400 participantes reunidos nas imediações da hidrelétrica de Itaipu foi um estado de rebelião global contra os monopólios midiáticos.

(…) No fim, o evento, além de condenar as ações dos Estados Unidos contra Cuba por limitar seu acesso à Internet, também apontava como primeira de suas prioridades ‘a luta pela liberdade de expressão, que não deve ser confundida com a ideia de liberdade propagada pelos monopólios midiáticos, que castram pluralidade informativa.

(…) Olho o livro de Fernando Morais sobre ‘Os Cinco’ e leio em sua sinopse: ‘uma trama transobrdante jamais revelada pela imprensa’. E penso que nada é mera coincidência neste mundo no qual, como reza o título de um bom livro, o jornalismo é notícia”.

Repercussão em Cuba e além

Presidente de Cuba, Miguel Díaz-Canel Bermúdez manifestou luto em suas redes sociais: “A Revolução Cubana perde um filho que consagrou a ela e ao ideal socialista até suas últimas energias. Como intelectual incansável, Iroel Sánchez deixa uma grande e valiosa obra, um modelo de revolucionário total”.

Responsável pela comunicação do movimento político espanhol Izquierda Unida, Caros Gonzáles Penalva publicou artigo no qual afirma que “a vida de Iroel Sánchez é a de um explorador de nosso tempo. Um defensor apaixonado da classe trabalhadora, com um acúmulo histórico de conhecimentos enciclopédicos e uma memória com capacidade de análise meticulosamente organizada. A realidade mutante do nosso tempo nunca conseguiu desequilibar seu sólido núcleo ideológico, intelectual e moral”.

“Existem flores teimosas e firmes que não deixam nunca de combater. No passado 18 de maio perdemos uma delas em Cuba. Não tenho nem forças para falar dele no passado: Iroel Sánchez”, escreveu Pascual Serrano, que também participou do Encontro Mundial de Blogueiros em Foz do Iguaçu, promovido pelo Barão, em 2011.

Fundador do Rebelión no ano de 1996, o jornalista e escritor espanhol deu o seguinte depoimento: “Nos conhecemos há 20 anos, em Oviedo, no meu país. Desde então, com sua vitalidade, me arrastava a todos os seus projetos: a Feira do Livro de Havana; a revista La Jiribilla; EcuRed; La Pupila Insomne… me arrastava e a qualquer um que se aproximasse dele. Ou seja, o que se entende por um bom combatente: a pessoa que luta e consegue transmitir força a todos ao seu redor”.

“Com Iroel”, complementa Serrano, “estive na Espanha, em Caracas, em Mar del Plata, no Saara. Em todos os lugares, a todas as horas, em todas as circunstâncias, ele estava lutando incansavelmente pela Revolução, por justiça, pelo socialismo e pela verdade. Com Iroel, você se sentia como remando rumo ao horizonte da utopia. Esse barco, agora, perde impulso. Por isso devemos remar mais forte. Prometemos a ele seguir avançando e só assim mostraremos que ele segue entre nós”.

Pascual Serrano, o segundo da esquerda para a direita, no Encontro Mundial de Blogueiros, em Foz do Iguaçu.

 

A publicação desta matéria é uma homenagem ao amigo Iroel Sánchez e seu legado, que segue presente em nossa luta como fonte de inspiração. Iroel, presente!