7 de julho de 2024

Search
Close this search box.

Em ‘Mascarados’, autores ouvem quem adotou tática Black Bloc

 

Por Priscila Passareli

Baderneiros, desocupados, filhinhos de papai, bandidos — estes e outros adjetivos menos elegantes estiveram na ponta da língua de muita gente para definir os adeptos da tática Black Bloc, que, a partir de junho de 2013, invadiram as ruas com suas manifestações violentas e, para alguns, selvagens.

Assim foram rotulados os jovens mascarados e vestidos de preto que estilhaçaram as fachadas de vidro de agências bancárias, depredaram e incendiaram lixeiras, destruíram pontos de ônibus e enfrentaram a Polícia Militar com pedradas e até garrafas incendiárias.

Mascarados – a verdadeira história dos adeptos da tática Black Bloc (336 páginas, R$ 34,90) — publicado pela Geração Editorial é do 12º livro-reportagem da coleção História Agora, a mais polêmica do mercado editorial brasileiro, com obras como A Privataria Tucana, A Outra História do MensalãoSegredos do Conclave e O Príncipe da Privataria – revela outra realidade, bem mais complexa.

Pela visão da pesquisadora, socióloga e professora da Universidade Federal de São Paulo — Unifesp, Esther Solano Gallego, e pelos relatos do jornalista Bruno Paes Manso e dos próprios Black Blocs, e de um coronel da PM agredido pelos mascarados, entrevistados pelo jornalista Willian Novaes, lança-se uma nova luz sobre o assunto.

A verdade é um poliedro, diz a introdução do livro, para definir as diversas maneiras como podem ser vistos os jovens que levaram as autoridades a perder o sono desde o início das manifestações.

A professora mostra que por trás da selvageria há uma mensagem — a voz do povo cansado da opressão a que é submetido no dia a dia. Para eles, revela Esther Solano Gallego, a violência do quebra-quebra é apenas jogo de cena se comparado às milhares de mortes, muitas delas tendo policiais como autores, que acontecem todo ano no Brasil — violência estatal que vitima principalmente os jovens das regiões mais afastadas, onde o Poder Público chega somente, ou principalmente, como repressor e nunca, ou raramente, como provedor de bem-estar e desenvolvimento.

Para chegar ao fundo da alma Black Bloc, Esther acompanhou os protestos protagonizados pelo grupo in loco, correndo o risco de ser atingida por bombas ou pedradas.

Muitas vezes eram mais de seis horas acompanhando as manifestações. E ali mesmo ela entrevistava os ativistas, procurando entender a mente daqueles jovens e a nova realidade que se apresentava nas ruas de São Paulo e do Brasil.

O aprendizado de Esther foi o mesmo vivido pelo jornalista Bruno Paes Manso, um dos escalados pelo jornal O Estado de S. Paulo para cobrir a onda de protestos violentos.

Bruno, enquanto descreve o que viu, revela também o que aprendeu com o Black Bloc. Iniciou a cobertura jornalística com uma visão do movimento e saiu com outra. Se não aprova a tática, pelo menos não a classifica como coisa de vândalo ou desocupado.

A narrativa do jornalista mostra como, a cada protesto, sua visão sobre os jovens mascarados foi mudando e como ganharam o seu respeito.

Por fim, uma entrevista com Reynaldo Simões Rossi, coronel da PM, ferido em uma manifestação, e a visão dos próprios Black Blocs, contadas pelo jornalista Willian Novaes, por meio da história dos personagens que protagonizaram um ano de cenas de violência com o único objetivo de serem enxergados pela sociedade e, muito mais que isso, de transmitirem — talvez de uma maneira torta e equivocada — suas reivindicações de maior justiça social e fim das perseguições aos integrantes das camadas mais baixas da sociedade.

Histórias reais — assim se faz o bom jornalismo — mostram o jovem que já se acostumara a enfrentar policiais militares e é retirado de um acampamento pela mãe, como se fosse um menino travesso. Ou de outro, herdeiro de família quatrocentona e empresário bem-sucedido, que acabou aderindo ao movimento quando foi dar uma lição de moral em um dos jovens e ouviu verdades que o comoveram.

A carioca que vive pela causa e por isso é perseguida pela Polícia Militar e também pela milícia e que recebeu elogios do cantor Caetano Veloso em artigo publicado no jornal O Globo. Também tem o garoto homossexual da periferia de São Paulo que coordena as redes sociais do grupo, ou o adolescente apelidado de Mini Punk entre os seus pares.

Histórias de jovens que dificilmente vão mudar o Brasil com o que chamam de “ação direta”, mas que afinal conseguiram dar um recado às autoridades e trazer para a realidade do cotidiano da classe média a violência de que são vítimas.

“Os jovens que estão nas ruas merecem o respeito de serem tratados como atores políticos consequentes — e nossa indignação precisa estar orientada para a verdadeira violência, aquela que agride manifestantes pacíficos e faz desaparecer Amarildos. Afinal, vidas devem valer muito mais do que vidraças”, afirma Pablo Ortellado, professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP, no posfácio do livro.

O livro será lançado nesta terça-feira, 4 de novembro, a partir das 19h na Livraria Saraiva do Shopping Paulista (Rua Treze de Maio, 1947 – São Paulo).

Quem são os autores:

ESTHER SOLANO, doutora em Ciências Sociais pela Universidad Complutense de Madri, é professora de Relações Internacionais da Unifesp.

BRUNO PAES MANSO, formado em economia (USP) e jornalismo (PUC-SP), trabalhou por dez anos como repórter no jornal O Estado de S. Paulo. Também atuou na Revista Veja, Folha da Tarde e Folha de S. Paulo.

WILLIAN NOVAES, jornalista, trabalhou nas redações de IstoÉ, Diário de S. Paulo e Diário do Grande ABC. Atualmente é diretor da Geração Editorial.