“Tenho um otimismo grande sobre esse momento histórico que estamos vivenciando”, assinala Capriglione. “Há em curso uma revolução tecnológica gigantesca e há, também, profissionais e ativistas com vontade de fazer jornalismo, reportagem, fotografia, mesmo fora dos grandes veículos”.
Com passagens por grandes redações, como a do Estadão e a da Veja, a jornalista opina que esse ambiente de contrainformação nasce quando os movimentos sociais se dão conta de que manter uma assessoria de imprensa e enviar releases para a grande mídia é inútil, pois suas portas estão fechadas. “Primeiro, houve uma crítica feroz à mídia tradicional, que concebeu o apelido PIG, pelo seu comportamento monolítico e partidarizado”, sublinha. “É aí, inclusive, que surgem os chamados blogueiros sujos”.
Em um segundo momento, na avaliação de Capriglione, as pessoas perceberam que havia um espaço fértil para contranarrativas. “Essa é a novidade do momento que vivemos: se a Globo não publica, publicaremos nós. Os movimentos sociais, os comunicadores desempregados, os artistas e as pessoas que querem contar histórias passaram a usar a dinâmica das redes sociais para disseminar informação”.
Os Jornalistas Livres surgem nesse contexto. “A experiência do coletivo tem sido riquíssima nesse sentido”, avalia. Ela conta que, frente aos atos dos dias 13 e 15 de março (o primeiro por parte dos movimentos sociais e o segundo, contra o governo de Dilma Rousseff), foi decidido chamar uma reunião para articular uma cobertura colaborativa. “No susto, convocamos todos que estavam dispostos a contar o que aconteceria nessas manifestações. Reunimos 68 pessoas”, relata. “Hackeamos a lógica da mídia tradicional utilizando as redes e transmitindo conteúdo por mídias sociais e pela nossa página”
Avanços do ativismo digital, atraso na regulação da mídia
Os avanços do ativismo e da comunicação digital, na visão de Lalo, contrasta com o recrudescimento do conservadorismo nos grandes meios de comunicação. “Às vezes me sinto nos anos 1960, quando o cerco da mídia ao então presidente João Goulart culminou no golpe militar”, diz. “A mídia trata Dilma da mesma forma que tratava Jango e, por isso, a sigla PIG não é exagero. A imprensa é golpista e está tentando derrubar Dilma, assim como tentou derrubar Lula”.
Por mais ricas que sejam as experiências das mídias alternativas – blogs, portais, redes e coletivos –, Lalo defende a regulação da mídia como condição primordial para a democratização do setor. “Se antes dizíamos ‘reforma agrária na lei e na marra’, hoje temos que exigir a ‘reforma agrária do ar’ [em referência ao espectro radioelétrico, ocupado pelas emissoras de radiodifusão] na lei e na marra. Na marra, estamos fazendo. Na lei, não”.
Ele lembra pesquisa feita recentemente pela Secretária de Comunicação da Presidência (Secom), que constatou a televisão como o principal meio de informação da grande maioria da população. “Depois da TV, ainda vem o rádio, que ninguém dá muita bola, mas que, em períodos eleitorais, tem papel decisivo. Todas as grandes rádios comerciais fazem oposição sistemática às políticas populares e aos movimentos sociais”, argumenta.
Por isso, Lalo defende uma política que combine esse avanço das novas mídias com a democratização dos meios de comunicação. “Essa democratização se dá em dois níveis: a lei de meios e o fortalecimento da comunicação pública”, aponta. No caso da comunicação pública, ele destaca a criação da EBC (Empresa Brasil de Comunicação) em 2007, mas lamenta a falta de projeção e aporte de recursos para alavancar o projeto a ponto de representar uma alternativa concreta “à Globo ou à Record”.
Em relação à lei de meios, o professor lamenta o atraso brasileiro em relação não só a países europeus e aos Estados Unidos, mas também aos vizinhos latino-americanos. “Estamos 80 anos atrasados em relação à Europa, mas também ficamos para atrás em relação a nações como o Equador, a Venezuela, a Bolívia, o Uruguai e a Argentina”, lista. “Todos esses países implantaram regulações de forma a ampliar a liberdade de expressão. Aqui no Brasil, quando falamos em regulação, já respondem que é censura. O debate não é fácil, mas temos que enfrentá-lo”.
Além da regulação econômica do setor, mencionada por Dilma Rousseff em sua campanha eleitoral, Lalo frisa a importância de garantir conteúdos diversificados na mídia, o que só acontecerá com um marco regulatório que vá além da proposta inicial da presidenta. “A lei de meios implica na criação, por exemplo, de órgãos reguladores que façam a mediação entre a sociedade e o setor da comunicação. Se você se ofende com algo que vê na TV, hoje, não tem para quem reclamar”.
O modelo argentino é o principal exemplo a ser seguido, avalia. O aspecto central, segundo ele, é o desmonte do monopólio privado, dominado historicamente pelo grupo Clarín, no caso argentino. “A lei dividiu o espectro radioelétrico em três partes: mídia privada, mídias públicas e veículos comunitários”, explica. “Além de ampliar o mercado de trabalho, essa política dá voz a setores antes invisibilizados pela mídia”.
No Brasil, 19 anteprojetos de lei para o setor já foram elaborados desde a Constituição. Nenhum avançou. “Agora, nos cabe lutar pelo Projeto de Lei da Mídia Democrática, de Iniciativa Popular. A ideia é pressionar por uma mobilização e discussão nacional sobre o tema”, opina.