Por Luis Nassif, no jornal GGN
Um dos fenômenos menos estudados no século 20 foi o do enorme poder conferido aos grupos de mídia e como dele se prevaleceram negociantes pouco escrupulosos, usando os conceitos de liberdade de imprensa como biombo para suas jogadas.
A melhor descrição desse método “empresarial” na mídia apareceu no Estadão, em uma crítica de Luiz Zanin Oricchio ao livro “Número Zero” de Umberto Eco (http://goo.gl/gV5ZqV).
O livro é uma ficção sobre um jornal montado em 1992 na Itália – no ano em que foi deflagrada a operação mãos limpas, que liquidou com o mundo político italiano, em nome da moralização de costumes, e abriu espaço para que o parceiro Silvio Berlusconi, magnata da mídia, aparecesse “como salvador de uma Itália falida”.
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Eco monta um “um sarcástico anticompêndio jornalístico, descrevendo práticas que bem podem servir de carapuça para parte da imprensa contemporânea”, diz Oricchio.
Algumas das lições:
* Como produzir acusações vagas, e sem provas, de modo que certas pessoas se sintam intimidadas, mas não consigam processar o jornal por difamação. (Ou, como) distorcer a realidade apenas relatando verdades.
* Como inserir declarações de testemunhas em meio ao texto, colocando o ponto de vista do jornal na boca do entrevistados.
* O uso de teorias da conspiração e da ameaça comunista contra o “mundo livre e cristão”.
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Ontem, no mesmo Estadão, o experiente correspondente do jornal em Genebra escreve matéria “EUA monitoram obras da Odebrecht no exterior e apontam sinais de corrupção” (http://goo.gl/x0OjEr). A reportagem se baseia em telegramas do serviço diplomático americano reproduzidos no site Wikileaks.
Uma jovem repórter do jornal GGN fez uma leitura cuidadosa dos documentos (http://goo.gl/bbKAxI) e constatou:
O documento intitulado “Uma visita produtiva de Lula”, é um relatório da visita do ex-presidente ao país, nos dias 17 e 18 de outubro de 2007. O encontro resultou em sete acordos de assistência técnica, a duplicação para US$ 2,3 bilhões da linha de crédito do Brasil para a Angola e o anúncio de um acordo de negociação para construir uma usina de etanol com a produção de cana. O relatório diz: “Apesar de não ser um acordo de governo-governo, a visita de [Lula] Silva ajudou a concluir um acordo entre a brasileira gigante da construção Odebrecht, a estatal petrolífera angolana Sonangal, e Damer, uma empresa angolana até então desconhecida”.
Continua o relatório: “A Angola vê o Brasil como um parceiro natural, e muitos dos principais homens de negócios de Angola, incluindo membros do clã do Santos [presidente angolano], supostamente têm interesses comerciais substanciais no Brasil. As grandes construtoras brasileiras também estão se beneficiado do crescimento da construção na Angola. (…) Os brasileiros também enxergam investimento na infra-estrutura angolana, especialmente para vinculá-la para o resto da SADC, como um sábio investimento e uma entrada potencial para eles e para o resto do mercado da África do Sul”.
O segundo documento em que Lula é citado é o apoio do ex-presidente à candidatura à reeleição de Hugo Chavez. “Poderia parecer um passo diplomático errado, mas realmente foi simplesmente um bom negócio”, diz a embaixada.