22 de novembro de 2024

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Direito de resposta impessoal é como a “Lei Falcão” do Cruzado de Sarney

Por Fernando Brito, no Tijolaço

Há pessoas, de boa-fé, que acham que pode estar “de bom tamanho” a lei de direito de resposta que limita seu exercício à leitura de uma nota de desmentido ou esclarecimento na TV ou no rádio. E invocam, como exemplo, o “direito de resposta” de Leonel Brizola na Rede Globo, em 1994. 

Como participante direto daquele momento, história que – depois de um longo período retraimento ético,já contei aqui– me perito demonstrar, para quem não alcançou a gravidade do veto inexplicavelmente aposto pela Presidenta da República ao texto que o Senado tão bravamente aprovou, porque isso não é, nem de longe, a verdade.

Nem vou falar do óbvio, que qualquer profissional de comunicação minimamente experiente dirá: evidente que uma nota impessoal, lida por um locutor ou sob uma cartela de direito de resposta jamais terá o mesmo peso da ofensa ou da mentira ali antes veiculada, com todos os recursos audiovisuais à disposição do ofensor.

Por que a de Brizola teve? Porque, primeiro, era notória e sabida de todos que, tal como está dito no direito de resposta lido por Cid Moreira, no dia 15 de março de 1994: Todos sabem que eu, Leonel Brizola, só posso ocupar espaço na Globo quando amparado pela Justiça. Aqui citam o meu nome para ser intrigado, desmerecido e achincalhado perante o povo brasileiro.”

Não é preciso dar  maiores explicações para dizer que, em relação a outros que não tivessem esta marca, o impacto seria muito menor. Como seria, também, se o direito de resposta fosse uma instituição praticada normalmente no Brasil e, mesmo que o fosse raramente, na sua mais importante emissora de televisão, a Globo. Houve, portanto, a repercussão de ser com Brizola a efetiva inauguração do direito de resposta no império global e a força de sê-lo com seu maior adversário.

Mas há um exemplo muito maior de como a simples leitura de textos tem pouca força ou, pelo mens, força menor do que a veiculação da mentira nas redes de TV, num episódio que só os que estão, como eu, para lá do “Cabo da Boa Esperança” podem lembrar.

Era 1986 e vivíamos a farsa do Plano Cruzado. Sarney e seus fiscais pontificavam na televisão. Fechavam-se mercados à força. Quércia dizia que ia “laçar boi no pasto”. Claro, havia eleições aquele ano. Praticamente só um dizia que aquilo era uma mentira e era sovado como Judas em Sábado de Aleluia por isso. Sim, o mesmo teimoso Leonel Brizola. 

E, como havia eleições, havia um impasse: a lei permitir que Brizola falasse no rádio e na televisão, ao longo da campanha eleitoral. E como, então, aceitar que aquele perigoso caudilho, de olho no olho e viva voz dissesse que o congelamento de preços iria durar, como só durou, até que os votos caíssem na urnas? José Sarney patrocinou, então, uma das mais escusas manobras político eleitorais de nossa história. Os que exerciam o cargo de Governador poderiam falar, claro, não havia base legal para proibir o seu exercício de liberdade de expressão. Mas não o podiam fazer pessoalmente, apenas através de textos escritos, lidos por um locutor. Era a volta da “Lei Falcão” das “eleições livres” da ditadura, com a fotinho e um texto.

Vivi, quase todos os dias, a agonia de fazer gravar os textos que Brizola escrevia ou aprovada. De imagem, púnhamos uma foto, outra foto, mais uma. Creio que era o Lauro (foge-me seu sobrenome, desculpem) o locutor, que se esmerava em fazer o melhor. Mas, claro, não era a mesma coisa que a força vulcânica das suas palavras, embora as palavras o fossem.

O resultado desta experiência atroz foi a eleição do nefando Moreira Franco ao Governo do Estado, derrotando – com a ajuda ingênua do PT e seu Gabeira que logo iria mostrar o que era – nada menos que Darcy Ribeiro. Em lugar de um apóstolo da Educação, elegeu-se um algoz das escolas de qualidade para nossas crianças.

O preço da amputação da presença em imagem, som e pessoa de quem quer restabelecer a verdade é, infelizmente, o da prevalência da mentira. O veto presidencial tem, para o exercício do direito de resposta, infelizmente, o mesmo sentido que tinha a Lei Falcão para a propaganda eleitoral e, pior, como é dirigida – todos sabemos – à presença do homem mais atacado na mídia, o ex-presidente Lula, mais parecida ainda com a versão que fez daquela monstruosidade jurídica o senhor José Sarney com a sua “Lava-Jato”, que era o Plano Cruzado.

É isso o que as décadas de vida política fora dos luxos dos salões me ensinaram. E é por isso que minha indignação brota, porque já vi onde isso dá e a quem servem tais coisas.

PS. A propósito: como às grandes redes de TV, no Brasil, não basta terem poder, mas todo o poder, esperem para ver como irão ao Supremo para derrubar, mesmo limitada, esta lei.. E o argumento será, na essência, o mesmo do veto da Presidenta, o de que o direito de resposta dará margem a abusos e excessos. Claro, excesso e abuso é privilégio deles, os donos da verdade, a mídia.