Por Felipe Bianchi
A crise que não sai nos jornais foi tema de debate na sexta-feira (31), na sede do Barão de Itararé, em São Paulo. De acordo com o senador Roberto Requião (PMDB-PR), não adianta os grandes meios de comunicação contrariarem os indicadores para fingir que as promessas de melhoras na economia, que culminaram no impeachment de Dilma Rousseff, deram algum resultado. Pelo contrário, a despeito de manchetes espalhafatosas e esperançosas, “a realidade entra pelas portas e janelas de nossas casas”, afirmou.
Segundo Requião, o programa do governo de Michel Temer baseia-se na regressão e caminha para atirar o país de volta à economia agro-industrial, de produção de commodities. “A Ponte Para o Futuro é uma agenda de funcionários de bancos que se dizem economistas. Acaba com a soberania social e o Estado social”, critica. “A história”, acrescenta o senador, “mostra que não dá pra enfrentar recessão só com a cartilha dos bancos e do rentismo”.
O governo Temer, na avaliação de Requião, está fazendo tudo errado. “Congelar investimentos e retirar direitos não é o caminho. É loucura”. Ao contrário do que tenta argumentar a maioria dos comentaristas econômicos da mídia monopolista, o senador não concorda com a tese de que o setor vem melhorando. “Os indicadores não apontam rigorosamente nenhum sinal de recuperação da economia”. Até por isso, opina, a rejeição a Temer atinge níveis altíssimos em pesquisas recentes. “Há alguma coisa no ar além dos aviões de carreira”, sugere.
Terrorismo midiático, um velho expediente
Professora da Universidade de São Paulo e ex-Secretária Municipal de Planejamento da cidade de São Paulo, Leda Paulani criticou o método do terrorismo econômico empregado pela mídia para atingir seus objetivos. De acordo com ela, desde a primeira eleição de Lula, em 2002, os meios de comunicação passaram a atuar como ferramenta de pressão. “O projeto dos donos da mídia era claro: derrotar Lula. Por isso, o discurso empregado foi de que a economia se desfazia como manteiga e de que estaríamos a poucos passos do abismo. No caso de Lula vencer, porém, o ambiente criado ajudaria a forçar o presidente a adotar uma agenda conservadora, da política macro-econômica. Foi o que aconteceu”, diz.
Apesar disso, ela destaca: “Políticas sociais, somadas a uma política externa ativa e altiva, diferenciou os governos dos últimos 13 anos. Nunca houve boa vontade com um governo liderado por um operário. Mas tentaram cassar esse ‘alvará’ desde 2005, no caso da cobertura da ação penal 470 [o chamado mensalão]”.
Em 2014, Paulani explica que a economia sofre abalos do impacto da crise mundial e o modelo adotado pelos governos Lula e Dilma, baseados no consumo interno, começou a se esgotar “Um crescimento puxado apenas pelo consumo, e baseado no crédito, tem pouca autonomia”, frisa a economista. Com esse cenário, em 2014 os setores conservadores e a grande mídia ‘deram de barato’ que venceriam as eleições, mas perderam novamente. “A partir daí, o terrorismo econômico da mídia se intensifica”, pontua. O final desse filme é o impeachment, sem crime de responsabilidade por parte de Dilma Rousseff, alçando ao poder um governo que, até a data do debate, contou com nove ministros com graves acusações de corrupção.
“A batalha travada pelas mídias alternativas é fundamental justamente porque enfrentam gigantes”, exalta Paulani. “A desonestidade desta mídia hegemônica é preocupante. Mesmo conservadora, a imprensa internacional não é mentirosa e descarada como a daqui”.
Golpe na indústria nacional
O desmonte da indústria nacional também foi abordado no debate. Para Murilo Pinheiro, presidente do Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo e da Federação Nacional dos Engenheiros, a situação do setor de engenharia e construção civil no país é quase que de calamidade. “Para cada empresa grande, há cerca de 50 a 100 empresas menores que são afetadas pela crise”, enumera.
Pinheiro calcula na casa dos 50 mil o número de desempregados na área. “Depois da Lava Jato, da discussão da Petrobras, as empresas de engenharia que exportavam tecnologia, trabalhavam em muitos países, praticamente acabaram. A corrupção tem que ser punida, não as empresas”, salienta, em tom crítico ao modus operandi da Operação Lava Jato.
Assim como Requião, que classificou a reforma previdenciária como a entrega da Seguridade Social à banca privatista nacional e internacional, Pinheiro também alerta para os danos que o ataque à aposentadoria e a reforma trabalhista devem causar. “Terceirização e as reformas trabalhista e da Previdência devem agravar ainda mais a crise não só para os engenheiros, mas para todas as categorias de trabalhadores”.
Diretor da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Mario Bernardini opina que, assim como no tema das reformas, a mídia teve papel fundamental também para a destituição de Dilma Rousseff. “Nosso país, até o ano passado, tinha uma série de problemas não resolvidos. Os meios de comunicação focaram apenas nas contas públicas e na corrupção. O fato de que a economia não ia bem e o país não crescia criou um ambiente propício para a ideia da mudança de governo”, diz.
O que houve, porém, não foi apenas a troca de governo, mas a troca de um grupo de poder. “Dois setores saíram extremamente empoderados a partir do impeachment: o Judiciário e os banqueiros”. Para ele, essa ‘turma’ vem causando sérios estragos. A forma como a Lava Jato investiga e pune as empreiteiras, por exemplo, já reduziu cerca de 300 mil empregos, aponta Bernardini.
Assista à íntegra do debate: