Por Claudia Rocha, para o projeto A Conta da Água
Fotos: Mídia NINJA
O evento foi bonito. Uma elegante festa de comemoração do aumento da tarifa da água: sacos de dólares e champanhe sobre a mesa mostraram fartura. Muito glamour.
Um grupo de ativistas ocupou, nesta quarta-feira (17), a sede da Bolsa de Valores de São Paulo em uma celebração que, possivelmente, já deve ter acontecido nos bastidores, entre acionistas, governo estadual e empreiteiras. Tarifa mais cara, serviço cada vez pior e investimento em obras faraônicas que surtem pouco resultado. Para eles, só alegria.
Assistindo atentamente ao ato, Lucilene Alves, moradora do Jardim Rincão (zona oeste), ficou espantada. “Eu nem acredito! Vai aumentar mesmo?”, lamentou a operadora de telemarketing que trabalha na região central. Com andar apressado, disparou: “Eu já nem lembro mais o que é tomar um banho em casa a noite, fecham minha água antes de eu chegar do trabalho às seis da tarde. É triste”.
Na farta mesa montada no calçadão da Rua XV de Novembro ninguém se preocupava com o sofrimento de Lucilene. “Tira uma selfie aqui pra gente mandar pra Sherazade”, comentavam. “Não tem água, bebam champanhe ué”, todos riam. E riam muito. Riam na cara do povo. A roda em torno da encenação teatral crescia; Só quem não acompanhava o ato eram os funcionários da Bovespa, que tiravam fotos de longe.
“É isso que acontece enquanto eu tô lá tomando banho de canequinha?”, pergunta João de Gouveia. O rapaz, morador do bairro do Imirim (zona norte), explica que faz três meses que a água está racionada onde mora: “A gente até tem caixa d’água, mas ela serve para quatro casas no mesmo quintal, tudo no gato. Quem chega primeiro do serviço tem mais sorte”, desabafa.
O aumento da tarifa dos serviços da Sabesp já havia sido autorizado em abril deste ano. Por conta do período eleitoral, o sr. governador – que não é bobo nem nada – decidiu adia-lo. Logo após a eleição, o anúncio: aumento de 6,5% a partir do dia 27 de dezembro, autorizado pela Agência Reguladora de Saneamento e Energia, a Arsesp.
“O objetivo deste ato é marcar a indignação com o aumento da tarifa. A água não pode ser mercantilizada desta forma. Cada vez mais as pessoas têm acesso a um serviço pior. Precisamos dar visibilidade a isso”, comenta Giulia Padini, representante do Coletivo Juntos!, que integra a organização da Assembleia Estadual da Água.
De acordo com dados divulgados pela Diretoria Econômico-Financeira e de Relações com os Investidores, entre 2003 e 2013, cerca de um terço do lucro líquido total da Sabesp foi repassado aos acionistas. O montante é da ordem de R$ 4,3 bilhões, o dobro do que a Sabesp investe anualmente em saneamento básico.
O comparativo entre o reajuste de tarifas do serviço de água e esgoto da Sabesp acumulado na última década, mantém a média de 12% acima do índice de inflação medido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) o índice de preços amplo ao consumidor (IPCA) no mesmo período.