Por Felipe Bianchi
‘Abaixo da crítica’. Foi assim que o consagrado jornalista Mino Carta definiu a mídia brasileira, em debate realizado na quarta-feira (14), no Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, em São Paulo. No evento, que marcou o lançamento do livro O quarto poder – Uma outra história (Ed. Hedra), do jornalista e blogueiro Paulo Henrique Amorim, o diretor de redação da CartaCapital comparou o cenário dos meios de comunicação nativos ao europeu, criticando a visão única e homogênea predominante no Brasil.
“Estive recentemente na Europa e lá há veículos que representam diversas visões e vários setores da sociedade”, pontua. “Aqui, todos dizem a mesma coisa”. O pensamento único, bastante mencionado nos editoriais escritos pelo jornalista, tem lado, conforme denuncia: “No Brasil, ainda não abolimos a casa grande e a senzala. A mídia é a porta-voz da Casa Grande”.
Nascido em Gênova e naturalizado brasileiro, Mino Carta cita o exemplo de seu país de origem para denunciar a falta de regras e limites ao poder do monopólio midiático brasileiro. “Na Itália do século passado já havia leis para a mídia. Uma delas, por exemplo, previa que o proprietário de um jornal não podia ser, também, diretor de redação”, conta. “E se o jornal mudasse sua orientação política declarada inicialmente quando alguém era contratado, era possível ao profissional demitir-se recebendo indenizações completas”.
Bem-humorado, Mino detona os produtos oferecidos ao público pelas grandes empresas de comunicação, como o tradicional periódico da família Mesquita. “Os açougueiros carcamanos compravam a edição dominical do Estadão, que vinha com um grande suplemento, para embrulhar a carne com aquele calhamaço de papel”, ironiza, elegendo nossos jornais ‘os mais feios do mundo’. Segundo ele, “para preservarmos nossos fígados, temos de deixar de lê-los”.
O diretor de redação da CartaCapital não esconde seu desânimo quanto à inércia do governo brasileiro em levar a cabo a regulação do setor, demanda crescente dos movimentos sociais e realidade concreta não só nos vizinhos Argentina, Uruguai, Equador e Venezuela, mas também em países como Inglaterra, França e Estados Unidos. “Cabe ao parlamento criar uma lei adequada. Sinto que talvez seja inútil evocar a democratização da mídia se o Congresso jamais dispor-se a aprová-la”, lamenta. “Não acredito que os problemas da mídia brasileira se resolvam logo. Levará, talvez, décadas”.
Outra mídia é possível
Consagrada em suas passagens por redações de grandes veículos, a jornalista Laura Capriglione é uma das articuladores do coletivo Jornalistas Livres, que reúne midiativistas com a proposta de fazer contraponto e disputar narrativas com meios tradicionais. Segundo ela, são mais de 90 mil iniciativas de mídia independente ativas no Brasil. “O desafio”, assinala, “é sair do gueto” e competir, de fato, com a grande mídia”.
Na avaliação dela, nunca existiram tantos motivos para ter esperança de que é possível transformar o cenário da comunicação. “Vivemos um momento bacana, com muita gente inteligente e disposta a enfrentar o monopólio midiático”, diz. “’Como os grandes meios não cobrem as greves, a crise hídrica, as pautas dos direitos humanos, estamos cobrindo por conta própria”, explica. “Com as mídias alternativas, tem gente narrando a violência policial como nunca antes vimos. Por causa dessas mídias soubemos quem era o Amarildo e conhecemos o nome e sobrenome de tantas vítimas do genocídio em curso nas periferias, por exemplo”.
As novas plataformas de comunicação exploradas por esses grupos fortalecem a luta por uma comunicação democrática, argumenta Capriglione. “Uma mídia que revela o que outra mídia sempre escondeu atualiza a necessidade de democratizar o setor”.