21 de novembro de 2024

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Precisamos falar sobre a seletividade da grande mídia no caso triplex

O momento da foto (Louise Botkay) e a versão publicada pelo Estadão (foto por Mauro Pimentel, da AFP)
Cobertura do caso triplex, ao longo de toda a investigação e julgamento de Lula, foi tão seletiva quanto a sentença de Sergio Moro
 
Véspera do julgamento de Lula, em segunda instância, por causa do triplex da OAS. O Estadão, jornal porta-voz da força-tarefa de Curitiba, decide entrevistar uma das testemunhas do julgamento que ajudou na sentença condenatória proferida por Sergio Moro, em julho de 2017. Entre 73 opções, escolheu a dedo aquela que melhor retrata o caráter político e midiático do processo: o ex-zelador do condomínio, José Afonso Pinheiro.
Estadão quis saber se Afonso espera ver o ex-presidente condenado e preso. Afonso, um homem declaradamente anti-Lula e que repetiu à exaustão que o petista era dono do triplex, apenas porque o viu visitar a unidade, sem nenhuma outra prova. Uma pauta que evidentemente saiu da redação com o lead pronto.
 
Melhor do que apenas especular sobre o porquê do jornal ter julgado conveniente entrevistar o ex-zelator do triplex às vésperas do julgamento de Lula é lembrar das inúmeras testemunhas que contradizem a acusação e que foram escanteadas por Moro, na sentença, e pela grande mídia, na cobertura jornalística.
 
Foi por meio de vídeos da Lava Jato que o Estadão divulgou com exclusividade em seu canal no Youtube – mas que, pelo conteúdo comprometedor para a Lava Jato, não foram devidamente analisados nem ganham destaque no portal ou na edição impressa – que o GGN produziu a reportagem “É provável, ouvi o boato, não comprou, mas é dono.” Ali ficou claro que a maioria das testemunhas ouvidas pelos procuradores de Curitiba foi assumidamente influenciada pelo noticiário, que vem martelando, há anos, e muito antes da ação penal nascer, que Lula tem um apartamento no Guarujá.
 
Apesar disso, as principais testemunhas, ou seja, os executivos que trabalhavam na OAS Empreendimentos à época dos fatos investigados, admitiram a inexistência de provas cabais de que Lula fosse o dono do apartamento. Ao contrário disso, testemunhas como Mariuze Aparecida da Silva, Igor Ramos Pontes, Roberto Moreira Ferreira ajudaram a mostrar que Lula era um “cliente em potencial”, mas que desistiu da compra.
 
O próprio “Afonso do triplex” disse a Moro: “(…) tinham corretores que faziam as vendas de apartamentos no Condomínio Solaris, e pessoas compravam porque achavam que o ex-presidente tinha um apartamento lá, os corretores mesmo faziam a propaganda do apartamento.”
 
Isso não entrou na entrevista do Estadão, mas consta nos autos e reforça a tese de que era de interesse da OAS reformar o apartamento para que Lula efetivasse a compra.
 
Por que nenhuma dessas testemunhas ganhou destaque na grande mídia, se não pela seletividade escrachada?
 
Nesse aspecto, a cobertura dos veículos tradicionais, ao longo de toda a investigação e do julgamento de Lula, se assemelha à própria sentença do triplex: nela, Moro selecionou a dedo e picotou os depoimentos para que se encaixassem melhor na acusação, e descartou sumariamente, como denuncia a defesa, aqueles que desmontam a denúncia.