22 de novembro de 2024

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Linchamento midiático destrói a democracia e a dignidade das pessoas, afirmam debatedores

Por Felipe Bianchi

Filha de José Genoíno, a pedagoga Miruna Genoíno esteve nesta quarta-feira (17) na sede do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, em São Paulo. Além de lançar seu livro Felicidade fechada (Ed. Cosmos), Miruna debateu o martírio de sua família ao longo do massacre sofrido por seu pai durante o julgamento na Ação Penal 470 (o ‘mensalão’). Ela contou com a companhia dos jornalistas Paulo Moreira Leite e Maria Inês Nassif, que foram enfáticos: o linchamento promovido pelos grandes meios de comunicação contra adversários políticos destrói a democracia e a dignidade das pessoas.

Foto: Sérgio Silva

“Como pedagoga, sei lidar muito bem com o poder que a palavra tem”, diz Miruna. Liberdade de imprensa, segundo ela, requer cuidado com as palavras. “Procurei o termo ‘linchamento’ em dois dicionários. Um dizia que significava ‘justiçar sumariamente ou sem julgamento’. O outro definia como ‘justiça sumária a um criminoso’. A escolha das palavras tem de ser muito bem pensada, como no exemplo dos dicionários”.

De acordo com ela, desde a primeira denúncia contra José Genoíno, a mídia já o havia condenado. “O linchamento afeta a família em dois momentos: primeiro, no impacto das denúncias. Depois, nos efeitos após o julgamento”, explica. “No início, o susto é grande. Amigos se afastam, a honestidade é colocada em xeque. Minha família foi encontrando formas de sobreviver a esse linchamento, formas de escapar dele”.

Apesar de no início do processo o cenário de meios alternativos ainda ser bem pequeno, Miruna exalta o papel do ativismo digital, dos blogs e veículos contra-hegemônicos para combater as condenações sumárias feitas pela mídia dominante. “Essas mídias alternativas fizeram muita falta naquele período [2005]. Não eram, ainda, tão fortes como hoje. São fundamentais para o contraponto”, pontua.”O momento do julgamento e da prisão é absurdamente difícil, mas, à medida que esse movimento surgia, tivermos apoio muito firme vindo das redes e dessas mídias”.

O maior exemplo disso, segundo ela, foi a campanha de arrecadação para o pagamento da multa de R$ 700 mil imposta a José Genoíno e o lançamento de Felicidade fechada, financiado em 11 dias também através de crowdfunding. “A coisa muda bastante com essa rede de resistência e apoio. A defesa contra o linchamento é muito mais contundente”, opina. “Apesar do linchamento midiático, vale a pena usar todos os espaços que temos, usar a palavra, fazer valer nossa voz”.

Golpe é fruto do linchamento midiático

“Vivemos um período de linchamento de nossa história, de nossas consciências”, opina Paulo Moreira Leite. “Miruna diz que, apesar do linchamento, vale a pena acreditar no que somos. É disso que se trata”. Segundo ele, o golpe judicial e parlamentar perpetrado contra Dilma Rousseff, em 2016, é fruto direto desse processo de massacre midiático que foi iniciado em 2005.

A postura de Miruna, de acordo com o jornalista, ensina sobre como deve-se posicionar frente às reformas, ao golpe, às batalhas colocadas. “Temos de entender que não somos espectadores, mas atores da história. Temos força pra isso”, aposta. 

Quanto ao expediente comumente usado pela mídia monopolista para eliminar adversários, Paulo Moreira Leite é tachativo: “O linchamento midiático faz parte de um projeto de destruição de reputações. Esse projeto, que culmina em um Estado de exceção, destrói, sobretudo, a dignidade das pessoas”. 

A caçada midiática e judicial contra Lula é um exemplo inevitável a ser utilizado, na avaliação do jornalista. “Lula já está condenado. O linchamento incessante sequer permite um desfecho diferente, em minha opinião. Não importa se é culpado ou inocente”.

Sanha por condenações ignora lições do passado

Para Maria Inês Nassif, casos clássicos de injustiça e destruição de reputações são sumariamente ignorados por uma mídia sedenta pela condenações dos que se colocam no caminho de seu projeto político. “Parece que ninguém lembra de casos como o da escola base e, na política, o caso do ministro Alceni Guerra”, provoca. Em ambos os episódios, os acusados foram submetidos à fúria da opinião pública antes de serem devidamente julgados e, posteriormente, inocentados. O que separa o caso da escola base do caso de Genoíno ou José Dirceu? Segundo a jornalista, a intenção política.

“Nossa Justiça hoje, com o Moro, é um inquérito Policial Militar. Não difere em nada, como na ditadura”, opina. Para ela, há uma espécie de aliança entre os interesses dos donos da mídia com o Poder Judiciário. “Com essa Justiça ‘de exceção’, os opositores vão sendo derrubados um a um”.

Quanto ao caso de Genoíno, Maria Inês Nassif opina que, apesar do julgamento e do linchamento, a condenação não apaga a sua história de luta. “O livro de Miruna é importante não só por contar essa história, mas por expor o estrago que esse massacre causa em uma família. O linchamento destrói a democracia, partidos, movimentos sociais, pessoas e, também, destrói famílias”.