Manifestamos publicamente nossa preocupação com os encaminhamentos em torno do Projeto de Lei nº 2.630 de 2020, de autoria do Senador Alessandro Vieira (CIDADANIA-SE), que visa instituir a Lei da Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet. A votação da matéria está prevista para a próxima quarta-feira (10).
O PL se propõe a combater as chamadas “fake news” no país, mas, sob essa promessa, ao focar na criminalização de determinados comportamentos, pode ter um efeito terrível sobre os direitos à liberdade de expressão, de imprensa e à liberdade de associação, prejudicando movimentos sociais e organizações de defesa de direitos humanos.
As diversas propostas apresentadas em torno do projeto no Senado, e outras similares protocoladas na Câmara dos Deputados, tipificam como crime condutas de maneira aberta e pouco objetiva, com potencial de enquadrar práticas cotidianas até mesmo na Lei de Organização Criminosa. Além disso, impõem a redes sociais e serviços de mensageria práticas de coleta massiva de dados pessoais, legitimando a vigilância em massa e tratando todas as pessoas que usem a Internet, mesmo sem nenhuma suspeita, como potenciais agentes de crimes e ilicitudes. Nos preocupa, portanto, que tais propostas materializem três riscos graves:
1) coleta excessiva de dados e vigilância em massa de cidadãos e organizações;
2) criminalização de diversas condutas;
3) conceitos mal formulados e genéricos que lastreiam a criminalização de atitudes.
Ressaltamos que vivemos um cenário atual de restrições diárias ao espaço cívico e democrático, em que movimentos sociais têm sido constantemente criminalizados e a legitimidade de sua atuação desrespeitada pelas mesmas instituições que deveriam zelar por direitos e garantias fundamentais. Portanto, preocupa-nos ainda mais a previsão de qualquer tipo de mudança a partir de conceitos que podem ser utilizados para vigiar, perseguir e condenar movimentos sociais e restringir o espaço cívico.
Nós, organizações signatárias da presente carta, reconhecemos a importância de se abordar o tema da disseminação de desinformação de maneira a coibir quem utiliza redes sociais e serviços de mensageria de forma organizada e em massa para violar direitos e prejudicar os regimes democráticos. Mas alertamos os Senadores Angelo Coronel e Alessandro Vieira que o conteúdo do projeto não pode, a pretexto de combater a desinformação no Brasil, abrir margem para a criminalização e vigilância de movimentos sociais e sociedade civil organizada ou para a coerção abusiva do direito à liberdade de expressão e associação.
Assinam a presente nota:
Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras (AMNB)
ARTIGO 19 Brasil
Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji)
Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT) – integrante do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH)
Casa da Cultura Digital Porto Alegre (CCPOA)
Central de Cooperativas Unisol Brasil – integrante do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH)
Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé
Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFEMEA)
Coding Rights
Comissão de Proteção de Dados e Privacidade da OAB-RJ
Conectas Direitos Humanos
Fórum da Amazônia Oriental (FAOR)
Fórum Permanente de Igualdade Racial (FOPIR)
Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC)
Informativo Dendicasa
InternetLab
Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
Instituto Bem Estar Brasil (IBEBrasil)
Instituto βeta: Internet & Democracia (IβIDEM)
Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC)
Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc)
Instituto Igarapé
Instituto de Pesquisa em Direito e Tecnologia do Recife (IP.rec)
Instituto de Referência em Internet e Sociedade (IRIS)
Instituto Sou da Paz
Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC)
Instituto Vladimir Herzog
Iser Assessoria
Justiça Global
Laboratório de Políticas Públicas e Internet (LAPIN)
Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) – integrante do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH)
Movimento Camponês Popular (MCP)
Movimento Negro Unificado (MNU) – integrante do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH)
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)
Odara – Instituto de Mulher Negra
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)
Plataforma de Direitos Humanos – DHESCA Brasil
Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político
Plataforma Conexão Malunga
Projeto Meninos e Meninas de Rua e Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua – integrante do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH)
Repórteres sem Fronteiras (RSF)
Rede Justiça Criminal
Terra de Direitos
Transparência Brasil
União Brasileira de Mulheres (UBM) – integrante do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH)