O Ato contra o massacre de jornalistas palestinos, realizado na noite da última terça-feira, 27, reuniu diversas entidades da área da comunicação, organizações políticas e representantes da comunidade palestina no Brasil.
Por Ana Rosa Carrara/SJSP
Fotos: Érika Ceconi/Barão de Itararé
Com transmissão ao vivo pelo Canal do Sindicato dos Jornalistas no Estado de São Paulo (SJSP) e mídias contra hegemônicas, o ato teve a organização das seguintes entidades: Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal), Coletivo Intervozes, Cebrapaz, Central Única dos Trabalhadores (CUT), União Nacional dos Estudantes (Une), assim como o SJSP.
Na abertura do evento, após a realização dos hinos do Brasil e da Palestina Thiago Tanji, presidente do SJSP, ressaltou a relevância da realização deste ato em um espaço histórico como é a Sede do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, que foi palco da mobilização em defesa dos Direitos Humanos e pela Democracia que denunciou a tortura e o assassinato do jornalista Vladimir Herzog, assim como hoje se denuncia o assassinato das centenas de jornalistas palestinos.
Thiago falou sobre os dados da Federação Internacional dos Jornalistas (FIJ), que dão conta de que 4 jornalistas Israelenses foram mortos – enfatizando que essas mortes também devem ser repudiadas e lamentadas por entidades representantes de comunicadores e pela sociedade -, no entanto, mais de 100 jornalistas palestinos, e ao menos 3 libaneses foram assassinados desde 7 de outubro.
Ele abordou o que vem ocorrendo em Gaza, pontuando que não é possível tratar a situação como um conflito entre duas forças bélicas regulares. ‘Estamos tratando aqui de uma sistemática política coordenada por Israel de apagar o povo palestino do mapa, tentando desumanizar as tantas e tantas vítimas de ataques por terra e bombardeiro dos israelenses. E como jornalistas, precisamos levar com clareza à sociedade que, quando companheiras/os denunciam uma ideologia supremacista sionista – que lamentavelmente embasa a política do Estado de Israel – não é correto e não é preciso realizar uma associação automática à religião judaica e aos membros desta comunidade’, disse Thiago.
Para o Ualid Rabah, presidente da Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal), o que se passa em Gaza pode ser explicado como a maior matança de comunicadores da história das guerras convencionais. Disse ainda que matar jornalista significa apagar da face da terra as testemunhas privilegiadas de um genocídio, para que as provas e indícios, do que ele qualificou como um crime de lesa humanidade, desapareçam.
Ao comentar a perseguição que figuras públicas estão sofrendo no Brasil, por denunciarem as ações do sionismo do Estado de Israel, Rabah afirmou que esse ‘É o primeiro crime de genocídio programado e incitado a partir dos veículos de comunicação já no dia 7. Nunca houve – senão o que foi registrado recentemente no continente africano em Ruanda – onde sentaram nos bancos dos réus os grandes veículos de comunicação, os seu proprietários, os seus editores, e é isso que teremos que fazer com que aconteça no Brasil. Não é possível que só os genocidas degenerados de Israel respondam por esse genocídio’.
Soraya Misleh, filha de palestinos e coordenadora da Frente em Defesa do Povo Palestino, ao falar do assassinato dos jornalistas em Gaza apresentou um dado do Comitê de proteção aos jornalistas, que apontam que mais de 75% dos jornalistas que foram mortos no mundo em 2023, foram no genocídio em Gaza.
Ao lembrar que esse é um genocídio que atravessa décadas, Soraya alerta. ‘Essa não é uma guerra pontual ou circunstâncias, não é uma guerra Hamas x Israel, é um genocídio como parte da tentativa de solução da nova fase da Nakba, a catástrofe palestina, cuja pedra fundamental é a formação do Estado racista e colonial de Israel em 15 de maio de 1948, mediante uma limpeza étnica planejada’.
Paulo Zocchi, Vice-presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), comenta que o ato é uma expressão da vontade da categoria dos jornalistas. Para ele, o SJSP tem como uma das suas lutas, o direito de consciência do jornalista, já que o que se vive é uma situação de imposição e uma ingerência por parte da mídia privada, que subverte o que é o jornalismo, profissão que deveria ser livre de amarras.
O vice-presidente da FENAJ, destaca que, nesse contexto em Gaza, os jornalistas são um alvo em específico, que o Estado de Israel persegue. ‘Numa guerra, num conflito, o jaleco de jornalista, o capacete de jornalista, deveria ser um equipamento de segurança do jornalista, mas na Faixa de Gaza ele é um alvo. Eu destaco, que na Segunda Guerra Mundial inteira morreram 69 jornalistas, na Faixa de Gaza morreram mais de 130 jornalistas’.
Zocchi defendeu que se rompa todos os acordos militares, comerciais, educacionais e até diplomáticas com Israel, para além de denunciar internacionalmente, como fez recentemente o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, na intenção de isolar o Estado de Israel.
Confira abaixo a íntegra da transmissão do ato contra o massecre dos jornalistas em Gaza:
Por sua vez, Breno Altman, jornalista do portal noticioso Opera Mundi, que vem sofrendo ataques e tentativa de censura por parte de organizações sionistas no Brasil, quis dar destaque ao processo de valentia heroica e insurgente do povo palestino que resiste por décadas contra o Estado sionista. segundo Altman, esse processo deve inspirar a todos contra o colonialismo e racismo, só combatidos, com a luta dos povos.
Sobre a declaração do presidente Lula, que denunciou internacionalmente que há um genocídio em curso em Gaza, Altman falou que ‘o fato novo é que ele colocou o dedo na ferida exposta do regime sionista, que é a comparação com o nazismo, é este o fato fundamental. É o presidente Lula ter enfrentado um tema que outros líderes mundiais, até o presente momento, se recusavam a fazer, o mito fundacional do regime sionista, é o Holocausto.’
Na análise de Altman, a legitimidade moral do Estado sionista está se esvaindo neste momento, o que demostra, segundo ele, que está preste a se acabar a condição da sua existência. Mas neste mote de esperança ele comenta que a única maneira de derrotar regimes coloniais é pela força, incluindo a força popular e de solidariedade internacional.
No encerramento do Ato, o presidente do SJSP, Thiago Tanji, leu um Manifesto dos jornalistas brasileiros, que foi aprovado pelas entidades presentes e será direcionado a representações dos três poderes do Estado brasileiro e organizações diplomáticas do Brasil.
Manifesto dos jornalistas brasileiros
Israel, pare de matar jornalistas palestinos. Cessar-fogo já. Basta de genocídio do povo palestino.
Ilmo. sr. presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva
Ilmo. sr. ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Paulo Roberto Pimenta
Ilmo. sr. ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira
Ilmo. sr. assessor-chefe da Assessoria Especial da Presidência da República, Celso Luiz Nunes Amorim
Ilmo. sr. ministro da Defesa, José Múcio Monteiro Filho
Ilmo. sr. ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski
Ilmo. sr. ministro dos Direitos Humanos, Sílvio Almeida
Nós, abaixo-assinados, estamos hoje reunidos no Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo, realizando ato contra o massacre de jornalistas na Faixa de Gaza. Nos encontramos no auditório que homenageia o jornalista judeu Vladimir Herzog, assassinado sob tortura pela ditadura militar, um crime bárbaro que até hoje continua impune.
Na data de hoje, 27 de fevereiro de 2024, o Estado de Israel bombardeia implacavelmente a Faixa de Gaza há 144 dias, matando até o momento cerca de 30 mil palestinas e palestinos, incluindo mais de 12 mil crianças. Há dez dias, o presidente Lula, em Adis Abeba, capital da Etiópia, disse a verdade que o mundo precisava ouvir: na Faixa de Gaza não está acontecendo uma guerra, mas um genocídio. Lula tem razão.
Vemos diariamente as Forças Armadas mais bem equipadas e treinadas do Oriente Médio atacando crianças e mulheres numa ação explícita de extermínio do povo palestino. Os jornalistas, no exercício da sua atividade profissional, têm sido alvos específicos da máquina de guerra. A atividade jornalística de simplesmente documentar e reportar fatos mostra-se intolerável para o Estado de Israel.
Segundo a Federação Internacional de Jornalistas (FIJ), nestes 144 dias de ataques contra Gaza, mais de cem jornalistas foram assassinados e assassinadas. No Estado de Israel, nos territórios palestinos ocupados, há dezenas de jornalistas na prisão, na maior parte dos casos sem qualquer acusação. É uma situação sem precedentes de ataque à atividade jornalística, atestada tanto pela FIJ como pelo Comitê de Proteção a Jornalistas e outras organizações de defesa da liberdade de imprensa.
Ao longo da Segunda Guerra Mundial, pelos dados disponíveis, foram mortos 69 jornalistas.
No Brasil, entidades vinculadas ao Estado de Israel tentam censurar vozes contra o genocídio em curso, como se vê nos ataques ao jornalista Breno Altman, diretor do site noticioso Opera Mundi. É caso também das ameaças à vida do jornalista Andrew Fishman, editor do site noticioso Intercept Brasil. Ambos merecem solidariedade, apoio e defesa das entidades democráticas e das que representam os jornalistas.
Nós, jornalistas e entidades de jornalistas brasileiros, nos manifestamos pelo cessar-fogo imediato na Palestina e pelo fim do bloqueio à Faixa de Gaza. Apoiamos a decisão do governo brasileiro de convocar o embaixador brasileiro em Tel Aviv, Frederico Meyer. Repudiamos os ataques do governo israelense ao Brasil e ao presidente Lula, cujas declarações foram não só corretas como imprescindíveis.
O Estado de Israel é estruturado por um complexo industrial-militar conectado aos interesses dos Estados Unidos e da União Europeia no Oriente Médio. O Estado brasileiro destina volumosos recursos financeiros para acordos militares de cooperação das Forças Armadas, modernização de equipamentos bélicos e aquisição de insumos de guerra e segurança pública, incluindo treinamento e capacitação da Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e polícias estaduais.
Os métodos israelenses de repressão a protestos populares ensinados nas academias policiais no Brasil, bem como seus respectivos equipamentos, colaboram para que os jornalistas sejam alvo de violência policial quando realizam seu trabalho na cobertura de manifestações.
Conclamamos o governo brasileiro a aderir à campanha de boicote e desinvestimentos a ações de Israel e assim romper todos os acordos e convênios da indústria militar de Israel.
A situação exige que o Brasil rompa relações diplomáticas com o Estado de Israel até o cessar-fogo definitivo na Palestina. É necessário barrar o genocídio imediatamente.