Destacada liderança da Assembleia Nacional do Equador e candidata à reeleição, Jhajaira Urresti condena a submissão de Guillermo Lasso ao Fundo Monetário Internacional (FMI), que inviabiliza o desenvolvimento do país. “Vamos devolver os bilhões de dólares retirados pelo FMI para os introduzir produtivamente em tudo aquilo que o nosso país precisa, que é agricultura, estradas, educação, na abertura imediata de postos de trabalho, na resolução dos problemas de saúde, segurança e reabilitação social”, afirmou.
Tendo seu olho esquerdo perfurado por uma bomba de gás lacrimogêneo, Jhahaira denuncia o crime de terrorismo de Estado instalado desde o governo de Moreno e agravado por Lasso, “um Pablo Escobar 2.0”, sublinhando a necessidade de reconstruir um caminho de justiça social. “Se no próximo domingo a Revolução Cidadã tiver o forte apoio e a confiança dos equatorianos, esse povo sabe que no dia seguinte, todo o processo de reconstrução que o nosso país merece já estará à vista, aguardando apenas a assinatura da nossa presidente Luisa González”, enfatizou.
Caio Teixeira, Leonardo Wexell Severo e Monica Fonseca | Comunicasul
Tens uma história reconhecida de luta em defesa dos direitos humanos no Equador. Como iniciou essa caminhada?
Primeiro, bem-vindo ao meu país. Bem-vindos ao Equador. Uma terra onde a ação libertária não termina. Chamo-me Jhajaira Urresti. Sou uma mulher jovem de 31 anos, graduada em Comunicação Organizacional e Gestão de Empresas. Faço parte da Ação de Libertação da Juventude desde os 14 anos de idade. Entrei na Universidade Central do Equador com 18 anos.
Eu já era mãe, o meu filhinho nessa altura tinha apenas quatro anos, eu fazia parte de uma entidade de mulheres e tivemos a primeira grande paralisação nacional. Nas mãos de quem estava a presidência? De Lenín Moreno. A própria vida começou a se tornar mais cara. Começámos a ter ondas de migração.
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Os subsídios aos combustíveis foram completamente retirados e as oportunidades de emprego começaram a diminuir da mesma forma, gerando pobreza e mendicidade. Participando da luta das mulheres e sendo presidente da Associação do La Tola, um bairro colonial de Quito, saímos para o cacerolazo [panelaço] contra a vida precária imposta pelo governo. Na noite de sábado, 12 de outubro de 2019, um policial disparou uma bomba de gás lacrimogêneo a dois metros de mim. Infelizmente, um pedaço da bomba penetrou no meu olho esquerdo e arrancou-o completamente.
Jhajaira perdeu o olho esquerdo devido à violência policial
Quando chegou outubro de 2019, enquanto nos arrancavam os olhos nas ruas, assassinavam o nosso povo, raptavam os nossos filhos, assaltavam nossas casas e nos revistavam simplesmente porque éramos vistos como oposição, isso não era transmitido pelos meios de comunicação que preferiam transmitir Bob Esponja e outros programas.
E eis que assume a presidência o Sr. Guillermo Lasso, que para todos nós, correístas, e sobretudo para mim, Jhajaira Urresti, é um Pablo Escobar 2.0. Quando ele assume a presidência, nosso país começa a ter estas ondas de tráfico de drogas introduzidas não só através dos mares, nas costas equatorianas, mas também nos nossos bairros, nas nossas capitais, nas nossas cidades. Já vemos pessoas decapitadas nas ruas, vemos mortos com cartazes pendurados nas pontes, vemos penitenciárias que já não são penitenciárias, mas sim, bases operacionais do narcotráfico e dos bandos criminosos. Vemos as Escolas do Milênio, idealizadas e criadas para as nossas crianças pela Revolução Cidadã (2007-2017) serem desmanteladas e seus espaços passarem a ser utilizados para criar escolas de sicários [assassinos contratados] para os nossos menores. Vimos como na área da saúde deixou de haver fornecimento de medicamentos e depois a pandemia da Covid 19 nos atingiu. A Covid revelou que o problema do tráfico de órgãos, do tráfico de crianças, do tráfico de seres humanos no nosso país é realmente catastrófico e a mídia corporativa não cumpriu o seu papel.
Como sentes o clima de terrorismo de Estado imposto pelo governo Lasso?
Vocês viram, no dia do debate, não foi? Viram que os candidatos de todas as correntes políticas tiveram praticamente de se camuflar entre a população para apoiar os nossos candidatos à presidência. No meu caso, Luisa González, uma grande amiga, camarada e companheira de luta. Mas tínhamos de estar camuflados e escondidos porque há poucos dias tinha sido assassinado um candidato à presidência. E em que condições esse candidato, Fernando Villavicencio, foi assassinado? Um candidato que era praticamente o melhor amigo do presidente, mas que, quando se tornou candidato à presidência da República, soubemos, através de relatos da sua ex-mulher e da sua irmã, que o governo de Guillermo Lasso tinha enviado ameaças contra ele.
“Dei meu olho para que o povo desperte. Não à impunidade e ao abuso de poder”
Esta não é a única ameaça de morte por parte do governo central. Recordemos o Sr. Ruben Cherres, um homem que era o braço armado do governo central, era o gerente e também o elo direto da máfia albanesa com o senhor Guillermo Lasso, e o assassinaram brutalmente. [Ruben Cherres foi torturado e assassinado em 31 de março deste ano numa casa de veraneio juntamente com a namorada e todos os que estavam na casa, inclusive seguranças]. Mas se assassinam um “correligionário”, muito mais facilmente nos matam, porque estamos denunciando a realidade em que vivemos. E não há processo judicial, não há justiça, o que há é impunidade.
Que efeitos esses assassinatos a dias da eleição podem ter sobre os eleitores? Cria-se um clima de pânico e o candidato Jan Topic se oferece como solução para “acabar com o medo”?
O fato de estarmos vivendo este clima no país não é novo. São seis anos em que se vêm moldando gradualmente o cenário que estamos vivendo. Hoje a violência, os abusos e as mortes violentas se normalizaram para os equatorianos. Antes uma morte na rua era notícia nacional. Atualmente, de 35 a 37 pessoas são mortas violentamente por dia no país sob o crime de sicariato [assassinatos de aluguel]. Para o equatoriano, para a mulher equatoriana, isto é agora normal. Vemos os nossos filhos serem raptados e isso já é normal.
Fomos abalados psicologicamente a tal ponto em que a violência, o abuso, o assédio, e o crime por assassinos contratados, os raptos de pessoas estão se tornando normais. Tudo isso gera insensibilidade e individualismo. Foi o que eles sempre quiseram fazer e foi isso que fizeram nestes seis anos. Já não é medo, é pânico estar nas ruas.
Vejamos o perfil do senhor Jan Topic. Ele não é um legionário como se apresenta [Topic propagandeia ser um soldado que combateu na Síria, Afeganistão e Ucrânia e é empresário do ramo da segurança]. É uma pessoa que espancou o seu meio-irmão quase até à morte, alguém que tem inúmeras acusações de agressão. Tem denúncias de abuso até mesmo nas suas próprias empresas.
Ele abusa dos trabalhadores. Há um vídeo circulando em que ele diz a empregados que têm menos de meia hora para fugirem, senão vão levar um tiro na cabeça. Vivemos tempos catastróficos e este “legionário” aparece sem qualquer conhecimento de causa na política, simplesmente com estas formações. Está envolvido até com escravidão, porque sua família fez parte de processos escravistas nas suas empresas, nas suas terras, e agora quer ser candidato à presidência. Ele não é necessário para o Equador. Uma pessoa com casaco de soldado e uma espingarda na mão para trazer tranquilidade? A tranquilidade se organiza e se constrói com políticas e, para além disso, com oportunidades de emprego.
Os equatorianos e equatorianas não nascem geneticamente conformados para serem assassinos de aluguel e criminosos. Esta situação é gerada porque não há oportunidades de emprego, não há educação, não há formação para os nossos jovens. Porque sabes que tens de ir para casa e a tua mãe está doente e não tens dinheiro para pagar os medicamentos. Com a Revolução Cidadã tínhamos toda a lista de medicamentos que nos era dada pelo governo central. Agora tens de pagar pelos remédios. Vais te tornar um delinquente porque tens de levar esse medicamento para que a tua mãe não morra. Por isso, para nós, a Revolução Cidadã combate primeiro a insegurança, mas não com mais violência. Geramos políticas públicas de reabilitação social nas prisões, criamos oportunidades de emprego e segurança social, e organizamos o processo educativo para as nossas crianças, jovens e adolescentes. Esse é o caminho para deixarmos de ter uma sociedade criminalizada. Para perder o medo. Para poder sair à rua, para termos mais sensibilidade e humanidade e, sobretudo, para vivermos num Estado de direito. Vivemos no Equador sob uma ditadura, embora o presidente Guillermo Lasso não se declare ditador. Mas o mecanismo que nós, equatorianos, estamos vivendo é uma ditadura.
Em outras palavras, não há Estado para o cidadão, mas para proteger o crime organizado. Como podemos mudar isso rapidamente?
O presidente Guillermo Lasso sempre disse que não podia governar porque existia a Assembleia Nacional e por isso a dissolveu. Já passaram quase três meses e nada foi feito. Mas Lasso precisava que ela fosse dissolvida para que não levássemos a julgamento a sua procuradora, Diana Salazar, que é a mentora, a responsável por encobrir estes processos nefastos de impunidade e catástrofe social que estamos vivendo.
É urgente impulsionar o processo de libertação da Pátria Grande. No Equador, começamos de forma profunda neste 20 de agosto com o voto consciente e histórico do povo contra a direita fascista. Se no próximo domingo a Revolução Cidadã tiver o forte apoio e a confiança dos equatorianos, esse povo sabe que no dia 21, todo o processo de reconstrução que nosso país merece já estará à vista, aguardando apenas a assinatura da nossa presidente Luisa González.
Em segundo lugar, nós, como Revolução Cidadã, somos rebeldes de nascença e não vamos nos vergar perante o Fundo Monetário Internacional (FMI). Azar o deles, mas nós vamos fazer com que os bilhões de dólares negociados com o FMI sejam introduzidos produtivamente em tudo aquilo que o nosso país precisa, que é agricultura, estradas, educação, abertura imediata de postos de trabalho, resolução dos problemas de saúde, segurança e reabilitação social. Temos de intervir nas penitenciárias para que deixem de ser dirigidas pelo crime organizado.
Antes, com a Revolução Cidadã, tínhamos prisões de baixa, média e alta periculosidade. Hoje em dia, não há divisão, as prisões têm todos os crimes em todas as alas e é por isso que geraram o que estamos vendo. Houve mais de 18 massacres no país dentro das prisões, em que as primeiras vítimas são pessoas que devem uma pensão de alimentos ou roubaram um celular, sem fazer parte de nenhum grupo criminoso. Portanto, a intervenção do Estado tem de ser profunda. Tem de ser com um profundo amor pelo povo equatoriano, mas com a grande determinação de não se vergar perante uma quadrilha organizada que se instalou no poder.
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