Por Cíntia Alves, no Jornal GGN
De todos os fatos importantes que ocorreram na quinta-feira (20), a denúncia que a Procuradoria Geral da República encaminhou ao Supremo Tribunal Federal contra o deputado Eduardo Cunha (PMDB), por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no âmbito da Lava Jato, foi o que ganhou destaque em quase todos os veículos da imprensa brasileira.
Uma questão foi levantada a partir da constatação de que Cunha pode vir a ser réu diante do Supremo em algumas semanas: deve o terceiro nome na linha de sucessão presidencial permanecer no comando da Câmara quando o processo penal for iniciado? Cunha já disse que é possível. E o que disseram nos espaços de opinião os principais jornais impressos do País?
A leitura de Folha de S. Paulo, Estadão e O Globo revela que apenas o primeiro veículo teve coragem de defender que Eduardo Cunha seja afastado da presidência da Câmara se o STF julgar que existem “elementos suficientes para receber a denúncia” do procurador-geral, Rodrigo Janot. Para o jornal dos Frias, isso evitará dúvidas sobre o uso da Câmara para atrapalhar as investigações e manterá a imagem da Casa distante do “banco dos réus”.
“Sem que haja ordem judicial em sentido diverso – nem mesmo se formulou pedido dessa natureza –, Cunha pode tomar a decisão que considerar mais adequada politicamente. À diferença de Severino Cavalcanti [ex-presidente da Câmara acusado de cobrar mensalinho de um empresário], o peemedebista não deixou de ter ascendência sobre a maior parte de seus colegas.
A situação será outra, no entanto, se o plenário do STF julgar que existem elementos suficientes para receber a denúncia, dando início ao processo penal.
Nessa hipótese, para que seus atos não mereçam sempre dupla interpretação e para que a imagem da Câmara dos Deputados não se confunda com a de uma figura no banco dos réus, Eduardo Cunha precisará deixar o comando da Casa. Espera-se que ele e seus pares tenham consciência disso”, publicou a Folha.
Já o Estadão trouxe na página que comporta opiniões sobre diversos assuntos ao menos três pautas que dizem respeito ao PT: a falta de reação de Dilma Rousseff diante da crise; o modo como o PT reagiu à fala de FHC sobre a presidente ter a “grandeza” de renunciar, e a restrição à Avenida Paulista aos domingos, encampada pelo prefeito Fernando Haddad. Nenhuma linha denotando qual o posicionamento do veículo diante da denúncia de Cunha na Lava Jato.
Sobrou para a colunista Eliane Cantanhêde dizer algumas palavras ásperas sobre o deputado. Por exemplo, que, “há décadas, desde que Cunha despontou na política, já enrolado em maracutaias, sabe-se que ele é bastante polêmico e, de santo, não tem nada.”
Cunha, dessa vez, foi acusado de cobrar pessoalmente, em 2011, cerca de 5 milhões de dólares em propina para não atrapalhar os negócio da Petrobras com uma empresa fornecedora de navios sonda. A denúncia da PGR traz detalhes sobre o local, o horário, o veículo usado e as pessoas que Cunha encontrou no Rio de Janeiro para tratar da transação financeira. Ele ainda teria articulado o recebimento de dinheiro sujo por meio de uma igreja evangélica.
“(…) contra fatos não há argumentos, e os fatos envolvendo Eduardo Cunha parecem muito bem embasados. São milhões de dólares de empresas que têm contratos com a Petrobras que passearam por contas no exterior, por notas frias e até por igrejas e foram parar nas contas de Cunha e de Collor”, publicou Cantanhêde.
“A chance de Cunha manter a presidência da Câmara é zero”, apostou a colunista, “mas todo mundo já sabe como ele é e como ele age. Ele vai gritar, espernear e usar a metralhadora giratória antes de cair”, advertiu. “E, certamente, não cairá sozinho”, projetou, parecendo mais preocupada com o que isso traz de resultado para a crise do governo Dilma.
O Globo, por sua vez, desenrolou em alguns parágrafos as expectativas que se criaram em torno da denúncia de Cunha. E, ao final do editorial, desejou que instituições mantenham-se em pé diante do possível estouro do deputado, propenso a retaliações.
Assim como o Estadão, o jornal fluminense não respondeu à questão: Cunha deve ou não se afastar da presidência da Câmara?
“O estilo pessoal de Eduardo Cunha — ele avisa, sintomaticamente, que não renuncia à presidência da Câmara — aconselha cautela em comemorações antecipadas. O político desce a ladeira do prestígio e do poder (…), mas isso não significa que ainda não possa causar estragos no Congresso. O melhor é que assim não seja, diante da densa zona de turbulências econômicas por que passa o país, algo também capaz de tumultuar o ambiente político.”