8 de novembro de 2024

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Para Haddad, capa da Economist contra Bolsonaro é puxão de orelha: ‘Aonde o Brasil vai parar?’

Candidato escolhido por Lula para concorrer à presidência da República, Fernando Haddad (PT) falou a blogueiros e mídias alternativas no final da tarde desta segunda-feira (24), em São Paulo. Durante a sabatina, o presidenciável abordou temas como a crise entre os poderes e as instituições, as suas perspectivas de vitória em relação às pesquisas eleitorais e o enorme desafio para reconstruir uma sociedade cujo tecido está “esgarçado”.

Por Felipe Bianchi

Confira, na sequência, alguns dos tópicos abordados por Haddad durante a entrevista, que contou com a participação do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé e de veículos como Nocaute, Fórum, Jornal GGN, Rede Brasil Atual, Blog da Cidadania, Jornalistas Livres e Brasil 247.

Foto por Ana Flavia Marx/Barão de Itararé

Ameaça fascista e o puxão de orelha da Economist

“As pessoas estão apreensivas. Há uma parte expressiva da sociedade, que tem mais acesso à informação e que pensa o Brasil e seu espaço no cenário internacional, que pressente que o projeto de [Jair] Bolsonaro pode dar muito errado. A capa da Economist é um puxão de orelha no establishment brasileiro: “Onde é que vocês vão parar? Até onde vocês vão com essa insanidade?”. Eu diria que o campo dos direitos e o campo da ditadura, da solução pela força, está se moldando neste momento. Vamos colocar toda a nossa tradição a perder por causa desse sentimento de repulsa à ascensão dos mais pobres? Existe uma parcela da sociedade que não está conosco, mas creio que está disposta a barrar esse retrocesso.

 

Crise institucional e a questão militar

“O tecido social brasileiro vem sendo cada vez mais esgarçado. Cerzir um tecido esgarçado tem a ver com o funcionamento das instituições democráticas e republicanas. Cerzir o tecido esgarçado é recuperar a confiança das pessoas na democracia. Não estamos vivendo um período de normalidade. As instituições estão em crise. Precisamos fortalecer os poderes da República. O Poder Judiciário, o Poder Executivo e o Poder Legislativo estão desgastados, além de setores do Ministério Público (MP), que partidarizam o combate à corrupção. Nós queremos um MP apartidário e forte. Com quem se negocia? Com o próprio MP. É papel do presidente estender a mão às instituições para que funcionem melhor, assim com o o presidente deve se abrir às críticas dessas instituições para que o Executivo funcione melhor.

É preciso ter respeito às Forças Armadas, mas precisamos também do compromisso delas com as instituições democráticas. Isso tudo precisa estar afinado. Isso não é uma questão de opinião. Podemos divergir de programa, de ações de governo, de políticas, isso é a democracia. Outra coisa é você colocar em risco os fundamentos democráticos. Isso é muito perigoso”.

A tarefa de reconstrução da sociedade brasileira exigirá um tratamento que configura essa eleição como algo singular, fora do normal. Teremos de conversar e interagir muito com a sociedade. É um trabalho árduo pela frente pois temos fundamentos. Temos que reforçar o alicerce? Sim. Mas temos fundamentos para a arrancada. A economia reage, a política reage. Vai exigir ciência, compromisso, sinceridade.”

 

Campanha pelo Brasil e as pesquisas eleitorais

“Até duas semanas atrás, todos falavam que o PT era suicida. Parece que não. Temos que entender que 30% dos eleitores ainda não sabem que sou o candidato do PT, 12% ainda dizem, em pesquisas espontâneas, que vão votar no Lula. É um processo. Tenho 13 dias de campanha e 13 dias é um século, pro bem e pro mal. Nada está perdido e nada está garantido. Tinha muita gente que duvidava da estratégia do PT e já estava fazendo cálculos. ‘Não vai dar, vou de Ciro [Gomes]’. Mas começa-se a enxergar que o PT é viável na eleição. Temos que explicar quem é o candidato do PT, da centro-esquerda, dos direitos. É um trabalho de porta em porta, de fábrica em fábrica, até o dia 7 de outubro. Se formos para o segundo turno, começa outra campanha, que também não é simples.

Tem muita gente que vota no PT, um voto cativo, que muitas vezes não é captado pelas pesquisas. Numa determinada faixa de renda, na qual a pessoa tem dificuldade de obter informação, a pessoa pode se informar sobre o candidato e declarar voto às vésperas da eleição.

A passagem da nossa campanha pelo Nordeste foi boa, mas nossa passagem por Minas Gerais foi boa, por Santa Catarina foi boa, por Osasco e a região do ABC paulista foi boa. Claro que no Nordeste esse fenômeno está na frente – há estados onde temos 40% da intenção de voto. Mas em São Paulo, na capital, eu seria vencedor no segundo turno, segundo as pesquisas. Há algo acontecendo e não podemos achar que é apenas no Nordeste. A energia na rua é boa.”

 

O fator do antipetismo

“O antipetismo é algo que vem dede 1980. Eu ouço boato contra o Lula desde 1980. De tudo o que você pode imaginar: família, patrimônio. Por que? Pois ele é uma figura indesejável para a Casa Grande do país. Eles não contavam com o surgimento de um fenômeno como Lula. Não estava no roteiro pensado por eles na história do Brasil. Um nordestino vir de pau-de-arara pra São Paulo, ser presidente e deixar o cargo tendo batido a casa dos 80% de aprovação. Isso tudo sem nunca ter mudado de lado.”

 

O desafio de governar o Brasil e o legado de Lula

“Eu entendo que o desafio é muito grande. Mas dependendo do país que eu nascesse, eu não tentaria ser político. Se eu fosse sueco, eu tentaria ser artista, cientista, alguma outra coisa. Mas depois de 500 anos de história, temos a oportunidade de mudar o Brasil. Do ponto de vista da consciência histórica, temos que entender o que estava colocado em 2002, na primeira eleição de Lula; o que foi perdido recentemente; e o que está em jogo agora. Quando tudo vai dando certo na sua vida, você vai naturalizando, achando que é assim mesmo. É como a saúde: só cuidamos da saúde quando pegamos um resfriado. Mas antes do resfriado, achamos que somos imbatíveis. O Brasil não pegou um resfriado. Pegou uma pneumonia severa. E o legado do período de Lula está muito vivo, muito fresco na memória. As pessoas viveram um Brasil diferente.

O processo de construção democrática da República não é natural. É fruto de esforço nacional e de lutas populares. Pela primeira vez, vejo a oportunidade de uma tomada de consciência, de uma virada de página. As pessoas têm na memória um projeto que estava dando certo, que melhorou a vida das pessoas. Eu acredito nesse alicerce e que a sociedade vai responder, afirmativamente, a um chamado de reconstrução.”

 

 

Ciro Gomes e o campo progressista

“Todo mundo sabe da minha relação com Ciro. Fomos ministros do mesmo governo. Todos sabem que tivemos uma aproximação de um ano pra cá, tentamos intensamente montar uma chapa comum. Trabalhei muito pra isso, sem pressuposto que o protagonismo seria de partido A ou B, mas que estívessemos juntos. Estou falando a minha visão, não em nome do PT. Declarei publicamente, quando sofri ataques do PDT, que liguei pessoalmente ao Carlos Luppi [presidente do partido por qual concorre Ciro Gomes] para agendar uma conversa dele com Lula.

Temos que tomar cuidado com a possibilidade de acontecer o que está acontecendo em várias partes do mundo, como por exemplo na França, de ocorrer uma disputa da direita contra a extrema direita. Fiz esse alerta já em 2016. E avisei que, se fosse preciso o PT abrir mão do protagonismo, tinha de abrir. Mas acho que não devemos cindir nesse momento. Temos de olhar pelo lado de que temos uma chance muito grande de ter um representante do campo democrático e popular no segundo turno, para além do personalismo.”

 

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Assista à integra da coletiva: