23 de novembro de 2024

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Domingo, no Equador, o primeiro e único confronto do segundo turno entre Luisa e Noboa

O único debate confrontando Luisa Gonzáles e Daniel Noboa no segundo turno das eleições presidenciais equatorianas de 15 de outubro acontecerá no próximo domingo, dia primeiro, a duas semanas da votação. Diferente do Brasil, a contenda não é organizada por redes privadas de televisão, mas pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), a autoridade responsável pelas eleições, que o faz através do “Comitê de Debates Eleitorais”, por ele escolhido.

Por Caio Teixeira/ComunicaSul 

Para o segundo turno, o Comitê de Debates decidiu reduzir a discussão a apenas quatro temas e mudar os tempos de perguntas, respostas, réplicas e tréplicas nas intervenções dos candidatos. Luisa e Noboa terão dois minutos para responder as perguntas e 25 segundos para réplica. Com dois minutos, os candidatos vão poder argumentar sobre política de segurança pública num país violentíssimo com criminalidade descontrolada, onde assassinaram três políticos, incluindo um prefeito e um candidato a presidente, e metralharam outros dois nos dez dias que antecederam o primeiro turno, em 20 de agosto. Também terão dois minutos cada um para debater a questão da dolarização. Desdolariza ou mantém a cédula estadunidense como moeda corrente? Como? Que implicações teria uma ou outra decisão?

Dois minutos para dar respostas aos problemas do país

Serão perguntados sobre como resolver os problemas da saúde num país onde recentemente vítimas da pandemia de Covid foram enterradas em valas comuns e seus familiares até hoje lutam para encontrar entes perdidos. Dois minutos para responder! Que fazer com a Constituição do país? Revogar a de 2008 feita por uma Assembleia Constituinte e voltar à Constituição neoliberal anterior? Revogar a reforma neoliberal feita por Lenín Moreno, em 2018, através de “referendo”? Convocar uma nova Constituinte? Dois minutos para responder!

Fazendo uma comparação, no Brasil um advogado tem 10 minutos para tentar convencer um tribunal que a parte defendida por ele tem razão. Se for um processo penal (que envolve pena de privação da liberdade), pode chegar a 30 minutos. Antes disso ele teve a oportunidade, no mesmo processo que discute o assunto, de juntar todos os documentos, fotos, vídeos, pareceres, que julgou importantes para a defesa de sua tese (de acusação ou defesa) além de ouvir testemunhas perante um juiz. O juiz ou tribunal julgador tem obrigação legal de apreciar, analisar e considerar cada uma dessas peças e tudo isso referente a um fato específico, determinado no início do processo. Mesmo assim os erros judiciais abundam.

O formato de um debate presidencial no Equador não é muito diferente nem mais superficial do formato acordado pelas redes de televisão numa eleição brasileira. A diferença é que no Brasil, geralmente, temos mais debates. Em princípio cada rede de TV corre para fazer o seu, com critérios distintos, e temos várias redes.

Realizar apenas um debate no segundo turno, com tempos tão pequenos para exposição de ideias e apresentação de propostas para questões extremamente complexas, dificulta sobremaneira a discussão política necessária para uma escolha consciente do eleitor, restringindo tal debate à superfície dos reais problemas que importam à população.

A candidata Luisa Gonzáles, do Revolução Cidadã, que representa a opção progressista no segundo turno é muito boa em embates cara a cara. Com mente ágil e experiência política tende a derrotar os oponentes num debate aberto. Ainda mais Noboa, cujo único “superpoder” é ser bilionário o que, diga-se de passagem, o transforma num super-herói dos ricos membros de uma classe que pretende continuar controlando o Estado. Luisa é a mais prejudicada com a medida do CNE de limitar o número de debates e estabelecer regras que os mantenham na superficialidade.

O CNE é composto por cinco membros escolhidos através de um “concurso de mérito” organizado pelo “Conselho de Participação Cidadã e Controle Social” para um mandato de seis anos, devendo metade ser renovada de três em três anos. Esse Conselho, criado pela Constituição de 2008, foi alterado pelo referendo de 2018, artifício utilizado por Lenín Moreno, para reformar aspectos da Carta anterior, fruto de uma Assembleia Constituinte. O Revolução Cidadã, partido atual de Correa e Luisa, classifica aquele referendo como um golpe contra a Constituição já que não respeitou os requisitos legais, em especial a prévia manifestação da Corte Constitucional, o que é verdade. A apreciação pela Corte estava agendada para o dia 5 de dezembro, mas seis dias antes, em 29 de novembro, Moreno editou decretos convocando o referendo com as perguntas previamente propostas por ele. A Corte teria o papel de avaliar se a proposta e seu conteúdo estão de acordo com a Constituição. Poderia, por exemplo, modificar ou vetar perguntas que entendesse inconstitucionais.

A caneta viciada de Moreno 

O Conselho de Participação Cidadã e Controle Social (CPCCS), que escolhe os membros do CNE, foi alterado em 2018. Todos os membros foram destituídos e substituídos pela caneta de Lenín Moreno que nomeou Julio César Trujillo, para presidir o órgão, e os demais novos componentes, com mandatos até o ano que vem (2024).

O Conselho Nacional Eleitoral, responsável pelo processo eleitoral em curso, foi escolhido por um órgão fiel a Moreno e ao atual presidente-banqueiro, Guillermo Lasso, aliado político do primeiro na aprovação do referendo. Não apenas o CNE foi nomeado pelo CPCCS que, responsável pelo “controle social” do Estado, nomeia também a cúpula do Ministério Público, como a Procuradora Diana Salazar, coordenadora do processo contra Rafael Correa, que resultou em seu exílio na Bélgica.

O processo contra Correa foi uma espécie de braço internacional da Lava Jato, que aproveitou a participação da Odebrecht em obras públicas no Equador, para articular lá um processo bastante parecido com os de Curitiba especialmente nos atropelos e ilegalidades processuais com objetivo de bloquear uma candidatura progressista que tinha chances reais de vitória. Lula foi impedido de concorrer em 2018 e Correa em 2021, resultando na eleição de Jair Bolsonaro no Brasil e do banqueiro Guillermo Lasso no Equador, aliás, festejado por Bolsonaro.

A Constituição de 2008, fruto de uma Assembleia Constituinte convocada por Rafael Correa, sempre foi criticada pela direita e pelos grandes empresários, ao passo que as emendas de 2018, aprovadas por referendo, espécie de plebiscito no qual os eleitores respondem sim ou não, são criticadas pelos progressistas. Esta polêmica foi pautada pela grande mídia como tema essencial. Noboa propõe em seu programa de governo simplesmente “realizar um referendo” para mudar a Constituição, sem especificar o conteúdo.

O programa de Luisa González prevê “promover um processo re-constituinte para reinstitucionalizar o país depois da fraude do referendo inconstitucional de Lenín Moreno e da arbitrariedade do regime de Trujillo”. Um “processo re-constituínte”, nesses exatos termos não existe na Constituição cuja mudança pode ser feita por outra Constituinte convocada para esse fim ou por um Referendo, como fez Moreno em 2018. Recentemente começaram a pipocar notícias no sentido de que a proposta de Noboa seria um Referendo com objetivo de revogar a Constituição de 2008, com o que, voltaria a valer a anterior de cunho explicitamente neoliberal.

Com todas essas limitações, no próximo domingo, primeiro de outubro será a última chance da candidata progressista Luisa Gonzáles e do candidato bilionário Daniel Noboa se defrontarem na disputa dos votos do eleitorado indeciso ou que, por enquanto, decidiu votar em branco ou nulo, respectivamente de 14,4% e 11,8% de acordo com as últimas pesquisas divulgadas pelo instituto Comunicaliza. A conquista de parte desses eleitores pode alterar a quantidade dos votos válidos para um ou para outro candidato, o que deixa a eleição em aberto. O prazo para divulgação de pesquisas encerra dia 5, dez dias antes da votação.

O debate, com previsão de duas horas de duração, pode ser assistido no site do CNE do Equador, no domingo às 21 horas de Brasília.