24 de novembro de 2024

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No caso MBL x Nassif, STF abre caminho para fim do Lawfare judicial e a volta da liberdade de imprensa

Com voto do Ministro Ricardo Lewandowski, o Supremo Tribunal Federal (STF) abriu espaço para o fim do Lawfare  judicial contra a imprensa. O voto se refere à reclamação ajuizada contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo, em ação proposta pelo MBL (Movimento Brasil Livre), assinada por Aroldo Joaquim Camillo Filho, Marco Antônio Riechelmann Júnior, Alfredo Ermírio de Araújo Andrade e  Vinícius Dino de Menezes

Por Luis Nassif, no Jornal GGN

No voto, Lewandowski inicialmente acata a apelação ao STF,  “em conformidade com o art. 988 do Código de Processo Civil de 2015, é cabível para: (i) preservar a competência do Tribunal; (ii) garantir a autoridade de suas decisões e (iii) assegurar a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão desta Corte em controle concentrado de constitucionalidade”.

Na ADPF, o Plenário do STF  “garantiu “a ‘plena’ liberdade de imprensa como categoria jurídica proibitiva de qualquer tipo de censura prévia”, diz ele.

Diz o voto citado por ele:

A imprensa como plexo ou conjunto de ‘atividades’ ganha a dimensão de instituição-ideia, de modo a poder influenciar cada pessoa de per se e até mesmo formar o que se convencionou chamar de opinião pública. Pelo que ela, Constituição, destinou à imprensa o direito de controlar e revelar as coisas respeitantes à vida do Estado e da própria sociedade” (grifei). 

O corpo normativo da Constituição brasileira sinonimiza liberdade de informação jornalística e liberdade de imprensa, rechaçante de qualquer censura prévia a um direito que é signo e penhor da mais encarecida dignidade da pessoa humana, assim como do mais evoluído estado de civilização” (grifei). 

“Pelo seu reconhecido condão de vitalizar por muitos 4 modos a Constituição, tirando-a mais vezes do papel, a imprensa passa a manter com a democracia a mais entranhada relação de mútua dependência ou retroalimentação. Assim visualizada como verdadeira irmã siamesa da democracia, a imprensa passa a desfrutar de uma liberdade de atuação ainda maior que a liberdade de pensamento, de informação e de expressão dos indivíduos em si mesmos considerados. O § 5o do art. 220 apresenta-se como norma constitucional de concretização de um pluralismo finalmente compreendido como fundamento das sociedades autenticamente democráticas; isto é, o pluralismo como a virtude democrática da respeitosa convivência dos contrários” (grifei). 

Ressalto, ainda, por conveniente, que o STF, na ocasião, consignou que “o pensamento crítico é parte integrante da informação plena e fidedigna”, assentando, ainda, que “o possível conteúdo socialmente útil da obra compensa eventuais excessos de estilo e da própria verve do autor” (grifei). 

Em seguida, coloca o direito de resposta como o caminho para a retificação de informações incorretas:

Sublinho, por fim, que o direito de resposta, previsto na Constituição e na lei, continua plenamente vigente, não tendo sido tolhido por esta Suprema Corte. No entanto, nos termos do julgado acima referido, “manifesta-se como ação de replicar ou de retificar matéria publicada”, sendo “exercitável por parte daquele que se vê ofendido em sua honra objetiva, ou então subjetiva, conforme estampado no inciso V do art. 5° da Constituição Federal” (grifei). 

A análise do caso

Na sequência, debruça-se especificamente sobre a ação do MBL e o acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo.

No presente caso, além mostrar-se evidente o cerceamento da liberdade de expressão constitucionalmente assegurada ao reclamante, a análise – mesmo superficial – do texto jornalístico censurado, demonstra, primo ictu occuli, que o alegado dano indenizável entrevisto no acórdão reclamado nem de longe chegou a materializar-se. 

Primeiro, pelo fato da matéria, em questão, ser uma denúncia da fundação planejada pela Lava Jato para receber as multas da Petrobras:

Ora, se o próprio Supremo Tribunal Federal, por seu Colegiado Maior, considerou ilegítima e reprovável a operação financeira levada a cabo por integrantes do Ministério Público Federal lotados no Paraná, não há como recriminar a crítica jornalística feita pelo reclamante, o qual, entendendo estar cumprindo o seu dever profissional, prenunciou que ela carrearia vultosos recursos para a indigitada fundação, bem assim para terceiros, com destinação eminentemente politico-partidária. 

Depois, pelo conteúdo questionado pelo MBL – e aceito pelo TJSP -, entendendo que em nenhum momento é imputado ao MBL ter recebido recursos da Lava Jato:

Verifico, ademais, que a matéria glosada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, lida com a devida atenção, quer dizer, objetivamente, apenas ressaltou que distintas entidades, “empunhando as bandeiras da Lava Jato, de luta contra a corrupção”, poderiam enquadrar-se nos estatutos daquela malfadada fundação, porém não imputou à beneficiária da indenização a prática de qualquer ato ilícito. Com efeito, apenas registrou que o Movimento Brasil Livre, valendo-se de considerável soma angariada com a “missão grandiosa de defender a iniciativa privada”, gerou “um batalhão de candidatos políticos”. 

Finalmente, condena o papel de juizes que se propõe o papel de “exegetas (análise de texto)” da verve jornalística “permitindo que imputem aos profissionais da escrita propósitos, quiçá, nem de longe por eles cogitados.”

“O ordenamento jurídico dos países democráticos, categoria na qual se espera esteja o Brasil incluído, por óbvio, não outorga aos juízes o papel de exegetas da verve jornalística, permitindo que imputem aos profissionais da escrita propósitos, quiçá, nem de longe por eles cogitados. Aqui vale recordar a conhecida reprimenda dirigida pelo pintor Apeles, na Grécia Antiga, a um sapateiro que apontou certo defeito na representação artística duma sandália: Sutor, ne ultra crepidam”.

Finalmente, deixa claro o papel do STF:

Incumbe ao Supremo Tribunal Federal, no desempenho de suas altas funções institucionais e como garantidor da intangibilidade da ordem constitucional, o grave compromisso – que lhe foi soberanamente delegado pela Assembleia Nacional Constituinte – de velar pela integridade dos direitos fundamentais, de repelir condutas governamentais abusivas, de conferir prevalência à essencial dignidade da pessoa humana, de fazer cumprir os pactos internacionais que protegem os grupos vulneráveis expostos a injustas perseguições e a práticas discriminatórias, de neutralizar qualquer ensaio de opressão estatal e de nulificar os excessos do Poder e os comportamentos desviantes de seus agentes e autoridades, que tanto deformam o significado democrático da própria Lei Fundamental da República”