5 de outubro de 2024

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Ex-presos políticos no Chile criam réplica de navio usado como centro de tortura pela ditadura de Pinochet

Ricardo Jorge Aravena Cerpa tinha 17 anos de idade quando foi preso em Valparaíso, dia 28 novembro de 1973, pela recém-instalada ditadura de Augusto Pinochet.

Líder estudantil na escola industrial e militante da Juventude Socialista de Valparaíso, foi detido em casa sob a acusação de ser militante infiltrado no Movimento de Esquerda Revolucionária (MIR), ativista subversivo e instrutor de escolas de Guerrilha em Rancagua, uma comuna da província de Cachapoal, interior do Chile.

Pinochet havia tomado o palácio Monera em 11 de setembro daquele ano, após um golpe militar que provocou o suicídio do presidente Salvador Allende. A partir dali até 1990, o Chile viveu 17 anos de intenso terror, perseguição, sequestros e assassinatos.

Por Rafael Duarte, de Valparaíso-CHI, para o SaibaMais/ComunicaSul*

Uma das estratégias usadas pela ditadura de Pinochet para negar as violações aos Direitos Humanos era esconder os presos e levá-los para bem longe dos olhos da população e das organizações humanitárias internacionais.

Assim nasce o navio Lebu como centro de detenção e tortura.

A embarcação foi cedida pela inglesa Companhia Sudamericana de Vapores e recebeu, entre setembro e dezembro de 1973, aproximadamente 1.200 presos políticos chilenos. Poucos sobreviveram às sessões de interrogatórios e tortura nos porões do navio.

Alguns deles, como Ricardo Aravena, decidiram recriar em 2021 uma réplica do Lebu para que os chilenos não esqueçam do horror da ditadura.

– Isso funcionou desde os primeiros dias do golpe, 12 ou 13 de setembro, até o final de dezembro do mesmo ano. É uma casa flutuante transitória, na qual ocorreu tortura física e psicológica. Você não sabia se sairia vivo ou morto. Nos tiravam do barco pela madrugada e nos levavam a quartéis do Exército para interrogar-nos”, destacou o ex-preso político.

O protótipo do navio Lebu será exposto dia 11 de dezembro no Parque Cultural de Valparaíso. Na ocasião, será lançado também o livro “El Sinistro Barco Lebu”, com testemunhos de seis ex-presos políticos sobreviventes do centro de tortura. Além de Ricardo Aravena participam da obra Antônio Oyarzo, Luis Madariaga, Alvaro Vidal, Gilberto Hernandez e Patrício Carasco. Em 2022, o projeto chegará ao Museu da Memória e Direitos Humanos de Santiago.

A reportagem da Agência Saiba Mais/ComunicaSul conversou com Ricardo Aravena sobre os 18 dias em que ele foi mantido preso sob tortura no Lebu. Mulheres, mesmo grávidas, eram trancadas e mantidas em condições subhumanas:– Aqui está representado como nós estávamos, enclausurados no fundo, sem nenhum tipo de proteção. Fazíamos nossas necessidades dentro desses baldes. Aí dentro. Havia muito mal cheiro e todo esse tipo de coisa. Com uma corda, suspendiam o balde e atiravam ao mar. Nossas companheiras eram mantidas em ‘camarotes’, nos quais era possível ver como elas estavam. Havia muitas mulheres grávidas detidas.

Segundo o ex-preso político, as sessões de tortura pareciam intermináveis:– Olha, foi muita tortura física e psicológica. Ameaça de matar toda a sua família caso não dissesse o que queriam. Tortura física com corrente elétrica, porradas. Praticavam o chamado ‘submarino’, que era nos deixar com goteiras pingando na cabeça durante todo o dia e noite, para te enfraquecer e dizer o que eles queriam ouvir”, destacou.

Confira vídeo especial da Agência Saiba Mais/ComunicaSul com Ricardo Aravaneda:

*Esta reportagem integra o projeto Saiba Mais/ComunicaSul no Chile e está sendo financiada pela Intersindical, Sindicato dos Bancários do RN, Sicoob, Sintrajufe/RS, Centro de Mídia Barão de Itararé, Apeoesp Sudoeste Centro, Sinjusc, Carta Maior, Hora do Povo, Diálogos do Sul, Agência Sindical e mais 136 pessoas que apoiaram individualmente esta cobertura colaborativa e acreditam no jornalismo independente.