7 de dezembro de 2024

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Livro aborda papel “terrorista” do Estado de Israel no assassinato de Jaime Roldós, presidente do Equador

“Quem matou Roldós?”, do jornalista, escritor e cineasta Jaime Galarza Zavala, mostra como, após o assassinato do presidente equatoriano, “as coisas ficaram mais fáceis para os israelenses” e seus sócios estadunidenses. “Roldós havia se convertido numa figura contrária aos desígnios dos sionistas”, que se apresentavam “com enciclopédias religiosas numa mão e uma bomba na outra”

Por Leonardo Wexell Severo/ComunicaSul 

Escrevo esta resenha, passados 104 dias do covarde ataque nazi-israelense à Faixa de Gaza, e o número de mortos neste pequeno território palestino de 2,2 milhões de pessoas supera 24 mil (mais de 10.600 crianças!) e o de feridos ultrapassa os 60 mil. Pela falta de remédio, médicos, hospitais, água potável e alimentação, muitos deles estão condenados. Se converterão em um traço a mais, seja para os seus assassinos sionistas, ou para o governo estadunidense, que dá sustentação – e estímulo – político, militar e financeiro ao “genocídio” tão bem denunciado pela África do Sul na Corte Internacional de Justiça de Haia.

Um sem-número de pessoas já perdeu ou perderá membros do corpo, em dias ou semanas. Ficará mutilada, sem mãos, braços, pés e pernas. Assim é a vida, diz a mídia venal, que sonha em varrer a Palestina do mapa, da mesma forma como festejou como heróis os mercenários que deram fim às vidas do presidente do Iraque, Saddam Hussein, e do líder líbio, Muammar Kadhafi.

O momento possibilita uma maior reflexão sobre o assassinato do ex-presidente do Equador, Jaime Roldós Aguilera (1979-1981), de 40 anos. Dirigente da Concentração das Forças Populares (CFP) e fundador do Partido Povo, Mudança e Democracia, Roldós foi explodido pela CIA (Agência Central de Inteligência) em um “acidente” aéreo no dia 24 de maio de 1981. Naquele “Ano do Avanço”, vinha realizando inúmeras atividades dentro do Plano Nacional de Desenvolvimento para romper com as amarras do atraso e da dependência, confrontando os interesses dos EUA e de Israel em várias frentes. Diante desta postura altiva, no mesmo ano, também em pleno voo, outros dois opositores ao imperialismo perderam a vida: Rafael Hoyos Rubio, comandante geral do Exército peruano, em junho; e o líder da revolução panamenha, Omar Torrijos, em julho.

Durante seu breve período de apenas um ano e nove meses na presidência, Roldós tornou-se referência na defesa dos direitos humanos, fazendo ecoar a luta pela democracia, pelo desenvolvimento nacional e a soberania na América Latina, se contrapondo à política de ferro e fogo “made in USA” que empesteava o continente. Ao mesmo tempo, logrou conquistas para o mercado interno ao decretar a duplicação do valor do salário mínimo e a redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais; impulsionar a criação de moradias populares; implementar o programa café da manhã escolar; investir em hidrelétricas, entre outros importantes avanços na área social e econômica.

“Israel: Estado racista e expansionista”

O livro “Quem matou Roldós?”, do jornalista equatoriano Jaime Galarza Zavala (Ediciones Solitierra, 1982), aborda o papel terrorista do Estado de Israel e avalia como “as coisas ficaram mais fáceis para os israelenses” e seus sócios estadunidenses após o assassinato do presidente. “Roldós havia se convertido numa figura contrária aos desígnios dos sionistas”, que se apresentavam “com enciclopédias religiosas numa mão e uma bomba na outra”, esclareceu.

O autor recorda que “quando apenas se vislumbrava a candidatura de Jaime Roldós Aguilera à presidência da República do Equador, e se formava o binômio Roldós-Hurtado, a direita internacional se pôs em ação para impedir o avanço e triunfo da fórmula cefepista-democrata cristã”. Descrevendo o papel do imperialismo, Zavala deixa claro que “no vagão de guerra contra essas candidaturas montaram diversos interesses”, e que isso “não foi só assunto norte-americano”.

“Não foi casual, por exemplo, que o arquiteto Sixto Durán Ballén, candidato direitista, fosse convidado a Israel, nem que entre seus partidários figurassem conhecidos amigos do Estado racista e expansionista com sede em Tel Aviv. Em um comício realizado em Guayaquil, Assad Bucaram, de reconhecida origem árabe, declarou: ‘minha candidatura foi vetada por uma potência racista’, referindo-se a Israel. O veto dos sionistas veio a prevalecer e converter-se em política de Estado graças à influência que o setor judio mais reacionário e seus parentes nacionais têm dentro do Equador, sem contar com o reforço gigantesco que alcançou a influência israelense sob as ditaduras militares”.

Uma breve visão geral das relações registradas neste campo, apontou Zavala, revela os seguintes dados: “Fornecimento de armas como metralhadora UZI e equipamentos paramilitares; fornecimento de aeronaves Kfir; contratos de manutenção de aeronaves equatorianas em Israel, incluindo retoques periódicos da pintura de camuflagem exibida; aconselhamento de inteligência militar; assessoria de inteligência policial; aconselhamento sobre recrutamento agrário, sobre agricultura, sobre cooperativas, sobre educação; cursos sindicais; empresas associadas equatorianas-israelenses; troca comercial desigual e totalmente favorável a Israel, de onde compramos milhões de dólares de cada um para quem vendemos, contribuindo desta forma com o atraso do Equador e a fome do nosso povo”. “Tudo isso sem contar com as tratativas secretas entre a ditadura militar e o dito Estado para a entrega de petróleo, que falta a Israel, e de concessões de mineração, particularmente de urânio”, declarou, condenando a “usurpação de terras legendárias do povo palestino, submetido a massacres, ao cárcere e à tortura”.

Em relação à ativa participação israelense nas entranhas da ditatura militar do Equador (1972-1979), o autor citou dois casos ocorridos, descrevendo com riqueza de detalhes o que sofreu nas mãos de generais fascistas equatorianos de abertas simpatias por Israel e “dos métodos repressivos empregados por seus congêneres no Brasil”.

Israelenses vindos de Brasília para a tortura

Logo no início da ditadura, ao ser preso em Quito, em 10 de novembro de 1972, Jaime Galarza Zavala lembra como foi levado ao Quartel de Paraquedistas, onde um “grupo especial” ficou responsável pelo tratamento dos “intensos interrogatórios”. O objetivo era arrancar dos numerosos equatorianos aprisionados falsos testemunhos, aos quais eram acusados por “diferentes fatos ocorridos em distintos anos e lugares”.

“Pois bem, quem fomos tratados deste modo, uns mais, outros menos, coincidimos na apreciação de que durante nossos interrogatórios havia investigadores que não víamos, por causa das vendas, e que não nos interrogavam diretamente, mas que atuavam como assessores diretos”, aponta. Nos informamos que essas vozes correspondiam a “uma equipe de sete investigadores israelenses, vindos expressamente de Brasília para intervir no processo de torturas e interrogatórios dos detidos”. Foram submetidos “durante vários dias” a todo tipo de barbáries, narra, desde ameaças com cachorros policiais a pontapés, espancamentos e asfixias.

O segundo caso se refere a uma história no início de 1977, durante a mesma ditadura, quando um ex-assessor de segurança do primeiro-ministro israelense Yitzhak Rabin, o general retirado Rehoman Zeevi, ofereceu ao Equador equipamentos e serviços para “combater o terrorismo”. Na verdade, eram três sionistas – junto com o ator Haim Topol e Bezalel Mizraji, que se apresentaram como donos de uma empresa privada, especializada em equipagens e “assessoramento antiterrorista e anti-guerrilha”. Segundo a imprensa, Zeevi havia deixado de ser conselheiro de Rabin “somente oito dias antes”.

“Graças a empresários como estes, se incrementa em toda a América Latina as atividades da CIA e do Mossad, que é a CIA de Israel, integrado por elementos racistas e fanáticos”, descreve o jornalista. “Quer dizer, a direita israelense veio aqui organizar e armar o terrorismo direitista do Equador. E isso para frear a perspectiva da democratização do país, depois de vários anos de ditaduras militares”.

Quanto ao ministro com o que os israelenses se acertaram, avalia o jornalista, “só podia ser um dos dois: o de Governo, general Bolívar Jarrín Cahueñas ou o de Defesa, general Andrés Arrata Macía. Ou os dois. Unicamente os ministérios de Governo e de Defesa tinham oficialmente sob sua responsabilidade as operações de inteligência. E se os empresários do terror estavam negociando com um deles para organizar grupos extramilitares e extrapoliciais, a fim de combater hipotéticas guerrilhas e supostos terrorismos. Isto significava que, de modo oficial, se patrocinava o terrorismo direitista no Equador”, esclareceu.

“O pensamento anticolonialista de Roldós”

O fato, assinalou o jornalista, é que “Jaime Roldós Aguilera não teve uma clara noção do perigo israelense”, que na breve confrontação entre Equador e Peru alimentava a estrutura militar de ambos os países.

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Depois de Roldós, assassinado em pleno voo em 24 de maio de 1981, foram abatidos o comandante geral Exército peruano, Rafael Hoyos Rubio, em junho; e o líder da revolução panamenha, Omar Torrijos, em julho (El Universo)

“Nos fatos concretos, Roldós atuava movido por seu pensamento anticolonialista e contrário ao racismo e à violação da soberania das nações. Por isso, quando o governo de Menahem Begin assumiu totalmente a cidade de Jerusalém, e a declarou capital da entidade sionista, Roldós ordenou que a Embaixada do Equador não saísse de Tel Aviv, o que causou um sério descontentamento às decisões de Israel. Consequente com sua política internacional, era previsível o incremento das relações com os países árabes e inclusive a abertura de um escritório de representação da OLP (Organização para a Libertação da Palestina) em Quito. A decisão de Roldós para que o Equador ingressasse no Movimento dos Países Não-Alinhados (logo executada pelo chanceler Barrera Valverde), seu apoio firme à OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), tão combatida pelo sionismo, o evidencia”. E mais, “enquanto Roldós apoiava a luta do povo salvadorenho contra a ditadura militar-democrata-cristã, Israel estava armando a ditadura contra o povo de El Salvador”.

Além disso, “na defesa dos direitos territoriais do Equador, violados pela agressão peruana, Roldós voltava a proclamar seu repúdio a toda anexação de territórios, em circunstâncias em que Israel insistia na anexação das colônias sírias de Golã, ocupadas desde a guerra anti-árabe que desencadeou em 1967”.

Cooperação do Mossad e da CIA 

Zavala reproduz um documento intitulado “Israel: inteligência estrangeira e serviços de segurança”, publicado pelo Washington Post, que aponta “um informe secreto em que o Mossad e a CIA cooperam em grande medida e trocam informações de forma abundante sobre os países árabes, fundamentalmente os mais ferozes inimigos de Israel (Síria, Líbia, Iraque, etc)”.

Condenando “o patriotismo das castas dominantes”, dispostas “a entregar o Equador a qualquer assaltante que apareça com faixa de super-homem”, Jaime Galarza Zavala contesta a submissão “aos portentosos homens de Sião, para nos salvar desses índios e grosseiros, preguiçosos e indolentes”.

Por isso, morto Roldós, as relações promíscuas de Equador com o estado expansionista de Israel foram “por trilhos, num trem de idílios”, revela, turbinadas “especialmente desde 13 de setembro de 1981, quando chegou a Quito o ministro de Relações Exteriores de Israel, o célebre Yitzhak Sahmir, em visita oficial”.

“Nisto há uma atitude colonialista e colonizada”, descreve o jornalista, funciona como “uma lenda do ser superior que é Israel, lenda que oculta fatos como a desapropriação das terras do povo palestino por meio do terror”, “um desenvolvimento produzido graças ao dinheiro acumulado por uma minúscula máfia de poderosos judeus, ao terrorismo aplicado contra os árabes, ao apoio econômico, bélico e financeiro dos Estados Unidos e de todo aquele submundo do capital”. “Em especial, da venda de armas e equipamentos bélicos e devemos investigar a fundo se têm ou não que ver com o assassinato do presidente Roldós”, concluiu.