9 de dezembro de 2024

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O nascimento da necessária Internacional Antifascista na Venezuela

O governo Nicolás Maduro convocou um Congresso Mundial contra o Fascismo, realizado em 10 e 11 de setembro, em Caracas, que decidiu pela formação de uma Internacional Antifascista, aprovada por 1.200 delegados, de 95 países, que terá sua direção instalada na capital da Venezuela Bolivariana.

Beto Almeida* | Monitor Mercantil

A decisão, de grande envergadura, é uma resposta à operação fascista mundial, patrocinada pelos EUA, que busca descreditar o resultado da eleição presidencial, realizada em julho de 2024, que reelegeu, pelo voto popular, o presidente Nicolás Maduro.

O questionamento do resultado eleitoral venezuelano é parte de uma operação fascista mundial, que inclui a disseminação da russofobia, bem como de práticas políticas neofascistas instaladas nos países da Otan, que também incluem políticas hostis contra a China, o Irã, contra Cuba, a Nicarágua Sandinista e também contra a integração latino-americana.

Venezuela sofre ataque cibernético internacional

No momento em que o Conselho Nacional Eleitoral venezuelano preparava-se para anunciar a totalização dos votos, em 28 de julho passado, o sistema de computadores sofreu ataque cibernético originado no exterior, que veio acompanhado de uma sistemática campanha midiática de largo alcance internacional, espalhando a fake news de que o candidato da oposição, Edmundo Gonzalez, comprovadamente um ex-agente da CIA, havia vencido a eleição.

Era operação desestabilizadora tão sofisticada que, enquanto o CNE estava tecnicamente impedido de apresentar a totalização dos votos, a oposição fascista, apoiada pelos EUA, divulgou seu próprio resultado eleitoral, publicando na internet súmulas eleitorais fraudadas, na qual se registrava a presença de eleitores mortos e até mesmo que o presidente Nicolás Maduro não havia votado em si mesmo.

Ato contínuo, a oposição fascista venezuelana lançou mão de ações violentas contra estações de metrô, de clínicas e escolas estatais, incendiando-as, para produzir a sensação de que haveria convulsão popular e desgoverno. Mas a ação da unidade cívico-militar se fez presente e debelou a programada anarquia da direita. Curioso é que há setores da esquerda que querem os bolsonaristas fascistas presos aqui no Brasil, mas protestam contra a prisão de fascistas lá na Venezuela…

Certamente, se a Venezuela não fora possuidora da maior reserva de petróleo do mundo, especialmente na bacia do Rio Orenoco, ainda não explorada, o país não estaria sendo alvo de constantes agressões internacionais, mal chamadas de sanções, quando são ações violentas, nem estaria sendo atingida por 930 medidas que vão desde a proibição da comercialização de petróleo (sua principal economia) até a cruel proibição de importação de remédios quimioterápicos e de insulina. Essas ações coercitivas tiveram início durante o governo de Barack Obama, inacreditável Prêmio Nobel da Paz, em março de 2014.

Petróleo alavanca democracia social bolivariana

Resistência tem sido a palavra fundamental para o povo venezuelano, enquanto vai, seguidamente, pelo voto popular, respaldando a continuidade e o aprofundamento da Revolução Bolivariana, que, fundamentalmente, consiste na utilização soberana da receita petroleira em favor de programas sociais que já levaram o país, conforme a Cepal, a pagar o maior salário mínimo da América Latina, a universalizar a aposentadoria a todos seus cidadãos, a conquistar 95% de educação pública e gratuita, bem como a erradicação do analfabetismo, como reconheceu a Unesco, talvez contra sua vontade.

Além disso, a renda petroleira alavancou a construção, pelo programa Missão Vivienda, de 5 milhões e 100 mil moradias populares, em prédios erguidos no centro de Caracas e das grandes cidades – não nas lonjuras da vida – sendo que as residências já vêm equipadas com geladeira, fogão e móveis indispensáveis para as famílias mais pobres. No Brasil, o petróleo pré-sal já está desnacionalizado em 70%, segundo a Associação dos Engenheiros da Petrobrás.

Todo esse processo de justiça social em expansão, ao longo dos 25 anos, foi duramente atacado pelos EUA e países da União Europeia, vassalos dos gringos. Porém, além da resistência protagonizada pelo povo venezuelano, apoiada na original e necessária aliança cívico-militar, arranjo dialético de Hugo Chávez para evitar que se repita lá o golpe que derrubou Allende no Chile, em 1973, a Revolução Bolivariana também conta com aliados sinceros, entre eles a Rússia, a China e Cuba que, durante a Covid, lhes forneceram as vacinas, já que o FMI, criminosamente, negou ao governo Maduro um crédito de apenas US$ 5 milhões para a compra dos medicamentos. Isso é para matar um povo!

Com uma vacinação que alcançou 100% do público, a Venezuela registrou uma perda de 5 mil vidas, considerada lamentável, mas reduzida se comparada com os EUA e o Brasil, por exemplo, proporcionalmente às suas respectivas populações.

Oxigênio bolivariano solidário salvou vidas em Manaus

Mesmo sob privações severas impostas pela Guerra Econômica dos EUA, a Venezuela doou, generosamente, oxigênio solidário à população de Manaus, quando, criminosamente abandonada pelo governo de Bolsonaro, a capital amazonense se transformara em um dramático cemitério a céu aberto.

Ainda não se conhece um sinal de agradecimento do governo brasileiro àquela generosa solidariedade bolivariana, que salvou milhares de vidas no Brasil, não passando de calúnia quando algumas vozes na esquerda brasileira se juntam ao bolsonarismo para insultar a Maduro como um ditador que rigorosamente não é.

Lula viola Constituição com ingerência na Venezuela

Surpreendentemente, o governo Lula, acompanhado do governo do colombiano Petro, país que tem em seu território 7 bases militares dos EUA, passou a questionar de forma injustificada os resultados eleitorais da Venezuela, em sintonia com o questionamento de Washington, em posição antagônica ao reconhecimento de Rússia, China e Irã, à vitória de Nicolás Maduro, acompanhados de mais 50 países, entre eles da Turquia, o primeiro país da Otan a reconhecer a vitória bolivariana, e, agora, a reivindicar seu ingresso no Brics. O mundo se move!

O questionamento brasileiro à soberania eleitoral venezuelana – violando a Constituição Cidadã que, em seu preâmbulo, estabelece, como cláusula pétrea, a proibição de ingerência em assuntos internos de outros países e o respeito à autodeterminação dos povos – ocorre paralelamente à confirmação de que o Brasil abastece com petróleo a máquina genocida de Israel, levando o presidente Lula a discursos controversos.

De um lado, condena, corretamente, o genocídio sionista contra os palestinos em Gaza, mas mantém a remessa do petróleo; é também controverso quando defende a integração da América Latina, mas questiona a Venezuela Bolivariana, assediada por guerra econômica, país que poderia ser o mais leal parceiro na obra integracionista regional defendida pelo próprio Lula.

O PT, que em nota oficial reconheceu os resultados eleitorais da reeleição de Maduro, não participou, oficialmente, do Congresso Mundial contra o Fascismo, muito embora seja titular na Secretaria-executiva do Foro de São Paulo.

Todas estas incoerências e posições controversas dos brasileiros destoam da solidariedade firmada entre o governo Maduro e o MST, que recebeu 10 mil hectares para produção no sistema de agroecologia, em terras bolivarianas, para onde enviará uma brigada de mil trabalhadores. Se a reforma agrária não avança aqui, avança lá.

O mesmo se poderia indagar sobre a posição do governo brasileiro que critica Elon Musk, mas não suspende a concessão da empresa Star Link, que controla as comunicações militares no Brasil, revelando uma soberania sequestrada, aliás, desde que FHC privatizou e desnacionalizou a Embratel. Na Venezuela, a empresa Star Link está proibida de se instalar.

O que se espera é que as recomendações contidas no indispensável livro de Samuel Pinheiro Guimarães Quinhentos Anos de Periferia voltem a guiar as diretrizes do Itamaraty, quando agia de forma verdadeiramente altiva e ativa, sendo que hoje, perigosamente, atua de modo errático e incoerente.

Os objetivos da política externa dos EUA para a América Latina não comportam uma esperança vaga de colaboração e cooperação com Washington, haja vista as recentes declarações hostis e ingerencistas da generala Laura Richardson, chefe do Comando Sul do Exército estadunidense, afirmando que as riquezas minerais dos países da América Latina são consideradas reservas estratégicas para o império do norte, acrescentando ser inadmissível, para ela, a soberana cooperação entre Brasil e China!

A resposta contra esta declaração hegemonista da generala veio, energicamente, da Embaixada da China no Brasil, defendendo a soberania da cooperação sino-brasileira. Por que não veio do Itamaraty, que se manteve mudo, e assim, vassalo?

Beto Almeida é jornalista, conselheiro da ABI e membro da Rede de Intelectuais em Defesa da Humanidade.